O Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) é reconhecido como uma das condições médicas mais incapacitantes do mundo. Para muitos pacientes, os tratamentos convencionais, como os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) e a terapia de exposição e prevenção de resposta (ERP), não são suficientes. Diante disso, estratégias alternativas vêm sendo exploradas. Um caso clínico publicado recentemente no Frontiers in Psychiatry traz um relato inédito: a remissão sustentada dos sintomas de TOC por meio da combinação de uma dieta cetogênica com a terapia ERP.
Contexto do Paciente
O estudo acompanhou um homem de 26 anos com histórico de TOC resistente a tratamento. Desde a adolescência, ele apresentava pensamentos intrusivos relacionados a temas perturbadores, além de rituais complexos de simetria, ordem e perfeição. Mesmo após tentativas com medicamentos como aripiprazol e propranolol e abordagens terapêuticas como terapia psicodinâmica e cognitivo-comportamental, os sintomas persistiam. Por conta própria, o paciente decidiu iniciar uma dieta cetogênica e, uma semana depois, começou um acompanhamento terapêutico baseado em ERP.
Intervenção Dietética
A dieta cetogênica adotada foi estruturada com uma razão de macronutrientes de 1,5:1 (gordura para proteínas + carboidratos), totalizando 71% das calorias vindas de gordura, 24% de proteína e apenas 4% de carboidratos. O paciente eliminou alimentos ultraprocessados e açucarados, mantendo níveis de cetose nutricional acima de 0,8 mmol/L, monitorados com o medidor Keto-Mojo®.
Além da dieta, ele realizou jejuns intermitentes e um jejum de 24 horas por mês, além de usar suplementos como ômega-3, eletrólitos, magnésio e N-acetilcisteína (NAC) com selênio.
Resultados Quantitativos
As melhorias foram rápidas e marcantes. Três semanas após o início da dieta, antes mesmo da implementação completa do ERP, o tempo diário gasto em compulsões caiu de 3 a 8 horas para menos de 1 hora. Os escores na Escala Dimensional de TOC (DOCS) para a dimensão de simetria diminuíram de 12 para 5 em sete semanas, e para 2 no seguimento de 95 semanas — indicativo de remissão sustentada.
As escalas de depressão, ansiedade e estresse (DASS-21) também demonstraram normalização dos escores em apenas três semanas de dieta, mantendo-se estáveis ao longo dos dois anos seguintes.
Resultados Qualitativos
O paciente relatou que a dieta cetogênica proporcionou maior estabilidade emocional, melhora do sono, energia constante e capacidade ampliada de engajamento na terapia ERP. Ele afirmou com convicção: “A dieta cetogênica salvou minha vida.”
Enquanto o ERP ensinou técnicas comportamentais para interromper os rituais, a dieta foi vista como a base metabólica e neurológica que viabilizou esse processo terapêutico.
Implicações Clínicas
Este caso é o primeiro relato publicado de remissão do TOC utilizando uma combinação de dieta cetogênica e ERP. A literatura já sugere que o TOC está associado a inflamação cerebral, desequilíbrios de glutamato e GABA, estresse oxidativo e hipometabolismo de glicose em regiões cerebrais críticas. A dieta cetogênica, ao melhorar a função mitocondrial, reduzir o estresse oxidativo e fornecer cetonas como combustível alternativo ao cérebro, pode atuar em múltiplas frentes fisiopatológicas do TOC.
Limitações e Considerações
Embora os resultados sejam promissores, trata-se de um estudo de caso único, o que impede generalizações. Fatores como efeito placebo, mudanças ambientais ou psicológicas não controladas, e o uso de NAC tornam impossível isolar o efeito exclusivo da dieta. Ainda assim, o fato de as melhoras ocorrerem antes da introdução dos exercícios de exposição sugere um papel independente da dieta cetogênica.
Futuros estudos devem avaliar a dieta cetogênica isoladamente e em associação com ERP em populações maiores, com controles adequados e avaliações qualitativas detalhadas, considerando a complexidade clínica do TOC.