A compreensão sobre como cada indivíduo responde aos carboidratos que consome está avançando graças a novas tecnologias e estudos detalhados. Um exemplo importante desse progresso foi publicado recentemente pela revista Nature Medicine, revelando dados valiosos sobre as grandes diferenças entre pessoas na forma como o açúcar no sangue (glicose) se eleva após as refeições — as chamadas respostas glicêmicas pós-prandiais (PPGRs).
A pesquisa acompanhou cuidadosamente 55 voluntários, todos sem diagnóstico prévio de diabetes, que utilizaram dispositivos de monitorização contínua da glicose (CGM) para medir suas respostas após consumirem sete tipos diferentes de refeições padronizadas com 50g de carboidratos: arroz, pão, batata, macarrão, feijão, uvas e frutas vermelhas. Além disso, foi testado se comer antes dessas refeições pequenas porções de fibras, proteínas ou gorduras (chamados "mitigadores") reduziria a elevação da glicose.
Logo no início, o estudo confirmou algo já esperado: alimentos diferentes provocam respostas glicêmicas diferentes. O arroz foi o que mais elevou a glicose na média, enquanto feijão e frutas vermelhas geraram elevações bem mais suaves. Mas o aspecto mais interessante foi que as diferenças entre pessoas foram muito maiores do que se imaginava: enquanto alguns tinham o maior pico com arroz ("rice-spikers"), outros reagiam mais ao pão, batata ou uvas. Pouquíssimos reagiram fortemente ao feijão ou frutas vermelhas.
Esse padrão sugere que as tabelas tradicionais de índice glicêmico (IG), que fornecem um número fixo para cada alimento, não refletem as variações reais entre indivíduos. Mais do que isso: as diferenças estavam ligadas à saúde metabólica de cada pessoa. Indivíduos com resistência à insulina (IR) e menor função das células beta (que produzem insulina no pâncreas) apresentaram picos maiores, principalmente com alimentos ricos em amido como batata e macarrão. Já os que eram sensíveis à insulina (IS) tinham picos menores e mais controlados.
Outro achado relevante foi sobre o efeito dos mitigadores. Em geral, tomar um pouco de fibra, proteína ou gordura antes de comer arroz reduziu modestamente os picos de glicose. Mas essa redução funcionou bem apenas para pessoas sensíveis à insulina; em quem tinha resistência à insulina ou disfunção das células beta, o efeito protetor quase desapareceu. Essa descoberta ajuda a entender porque algumas estratégias dietéticas, como "preloads" de proteína ou gordura antes das refeições, podem funcionar para uns e não para outros.
O estudo ainda identificou que certos fatores clínicos e moleculares previam essas respostas. Pessoas que reagiam mais ao pão ("bread-spikers"), por exemplo, tinham pressão arterial mais elevada e marcadores sanguíneos ligados à hipertensão. Aqueles que reagiam mais à batata ("potato-spikers") apresentavam sinais de maior resistência à insulina e de alterações no metabolismo de gorduras, inclusive um perfil de triglicerídeos que pode sugerir risco aumentado de doença hepática gordurosa não alcoólica (MASH). Já os "grape-spikers" eram geralmente os mais saudáveis metabolicamente.
As análises do microbioma intestinal também mostraram associações interessantes: algumas bactérias estavam ligadas a respostas glicêmicas mais altas, enquanto outras pareciam ter papel protetor. Isso indica que a microbiota intestinal pode contribuir para as diferenças individuais de forma significativa, ainda que os mecanismos exatos precisem ser melhor esclarecidos.
Outro ponto intrigante foi a relação entre etnia e resposta glicêmica. Participantes asiáticos tiveram maior chance de serem "rice-spikers", o que pode refletir tanto diferenças genéticas quanto fatores culturais relacionados ao consumo mais frequente de arroz.
Embora os resultados não permitam recomendações clínicas imediatas, eles reforçam a importância de personalizar a alimentação e mostram como o uso de CGMs pode ser útil mesmo em pessoas sem diabetes para identificar padrões individuais de resposta a diferentes alimentos. Em um futuro próximo, talvez seja possível estratificar indivíduos em subgrupos ("tipos de resposta a carboidratos") e oferecer recomendações alimentares específicas que levem em conta a fisiologia de cada um, prevenindo diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares.
Em resumo, este estudo revela que as respostas glicêmicas aos alimentos dependem menos do alimento isoladamente e mais de quem o consome e em que condição metabólica está. Para muitos, tabelas genéricas de índice glicêmico podem ser insuficientes. Uma nova era de "nutrição personalizada", baseada em dados reais de monitorização contínua da glicose e perfis metabólicos individuais, está se aproximando.
