Ingestão de nitrato e nitrito por fontes específicas e associação com câncer colorretal: estudo na coorte dinamarquesa Diet, Cancer and Health


O consumo de nitrato e nitrito na dieta, presentes em alimentos e na água potável, tem sido objeto de intensa investigação científica, especialmente pela possível ligação com a formação de compostos N-nitrosos carcinogênicos (NOCs) no organismo humano. Um estudo recente, conduzido com rigor na Danish Diet, Cancer and Health Cohort, buscou compreender essa relação de maneira mais detalhada e diferenciada, examinando as fontes específicas desses compostos e seus impactos sobre o risco de câncer colorretal (CCR).

Contexto e objetivos da pesquisa

A origem do nitrato e nitrito importa. Embora os nitratos encontrados em vegetais sejam tradicionalmente associados a benefícios cardiovasculares, sua presença em carnes processadas, carnes vermelhas e água potável levanta preocupações quanto à sua conversão em NOCs no trato gastrointestinal humano. Essa conversão pode ser favorecida por fatores como tabagismo, consumo elevado de carne vermelha e baixa ingestão de antioxidantes (como vitaminas C e E, folato e flavonoides), que normalmente inibem essa formação.

Com base nessas observações, os autores do estudo tinham como objetivo avaliar a ingestão de nitrato e nitrito de quatro fontes distintas — alimentos de origem vegetal, alimentos de origem animal (nitratos e nitritos naturais), carnes processadas (com aditivos permitidos) e água potável — e investigar suas associações com o risco de CCR e seus subtipos (câncer de cólon proximal, distal e câncer retal).

Metodologia

A análise utilizou dados de mais de 54 mil participantes, com idade entre 50 e 65 anos no momento do recrutamento (1993-1997), seguidos por até 27 anos. Informações dietéticas foram coletadas com um questionário validado e detalhado, enquanto a exposição a nitrato na água foi estimada com base no histórico residencial dos participantes e dados de monitoramento nacional da Dinamarca.

Foram aplicados modelos estatísticos robustos, com ajustes progressivos para fatores demográficos, comportamentais e dietéticos, permitindo analisar o impacto isolado e combinado das fontes de nitrato/nitrito.

Principais resultados

Os achados deste extenso acompanhamento foram reveladores e, em alguns aspectos, tranquilizadores:

  • Nitrato e nitrito provenientes de alimentos vegetais não apresentaram associação com aumento no risco de CCR. Na verdade, os resultados são coerentes com estudos anteriores sugerindo que o perfil antioxidante dos vegetais pode neutralizar potenciais efeitos adversos do nitrato.
  • Nitrato e nitrito naturais de alimentos de origem animal também não mostraram associação significativa com CCR, reforçando que o contexto alimentar e a matriz do alimento influenciam a biodisponibilidade e os efeitos metabólicos desses compostos.
  • Nitrato e nitrito de carnes processadas não se associaram com risco aumentado de CCR nesta coorte, possivelmente devido à baixa ingestão desses alimentos pelos participantes e às rigorosas regulamentações dinamarquesas que limitam o teor desses aditivos nas carnes processadas.

Contudo, uma exceção importante foi observada em relação à água potável: participantes que residiam em áreas onde a concentração de nitrato na água era igual ou superior a 9,25 mg/L apresentaram maior taxa de câncer de cólon distal (hazard ratio de 1,48) e de câncer de cólon em geral (hazard ratio de 1,52), especialmente entre fumantes e consumidores de carne vermelha. Já entre indivíduos com alta ingestão de antioxidantes dietéticos, essa associação foi atenuada.

Discussão e interpretações

Os resultados indicam que não há evidência de risco aumentado de câncer colorretal com o consumo de nitrato e nitrito de alimentos vegetais e animais ou carnes processadas em níveis observados na Dinamarca, mas sugerem atenção para a qualidade da água potável, mesmo quando os níveis de nitrato estão abaixo dos limites regulamentares atuais (50 mg/L).

Fatores que aumentam a formação de NOCs no organismo, como o tabagismo e alta ingestão de carne vermelha, potencializam o risco associado à exposição a nitrato na água potável, enquanto dietas ricas em folato, flavonoides e vitaminas antioxidantes parecem exercer um efeito protetor.

Conclusões e implicações para saúde pública

Este estudo reforça a necessidade de diferenciar as fontes dietéticas de nitrato/nitrito nas avaliações de risco, considerando o contexto alimentar e hábitos de vida. As evidências não sustentam que o nitrato presente naturalmente em alimentos vegetais ou animais aumente o risco de câncer colorretal. Já para a água potável, mesmo concentrações moderadas podem representar um risco, particularmente em grupos vulneráveis.

Em termos de políticas públicas, os autores destacam que revisões dos padrões de qualidade da água para nitrato podem ser justificadas, à luz dessas evidências emergentes, e que intervenções para promover dietas ricas em antioxidantes e para reduzir o tabagismo permanecem relevantes como estratégias de prevenção.

Fonte: https://doi.org/10.1016/j.envint.2025.109658

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