Pesquisadores do Adventist Health Study-2 publicaram um estudo no periódico Prostaglandins, Leukotrienes and Essential Fatty Acids que investigou a relação entre o tipo de alimentação e os níveis de ácidos graxos poli-insaturados (AGPI) — especialmente o EPA (ácido eicosapentaenoico) e o DHA (ácido docosa-hexaenoico) — no sangue. Esses dois compostos formam o chamado Índice Ômega-3 (O3I), marcador considerado fundamental para avaliar o risco de doenças cardiovasculares, inflamatórias e neurodegenerativas.
O estudo analisou 241 adultos divididos em quatro grupos:
- Veganos (VGN): nenhuma ingestão de alimentos de origem animal;
- Lacto-ovo vegetarianos (LOV): consumo de ovos e laticínios, mas não de carne ou peixe;
- Pesco-vegetarianos (PV): consumo de peixe, mas não de carne vermelha;
- Não vegetarianos (NV): consumo livre de carnes e peixes.
Todos os participantes estavam livres de suplementação de óleo de peixe. O objetivo foi comparar como o padrão alimentar afetava os níveis de EPA e DHA nas hemácias, medidos por cromatografia gasosa — método que reflete o status de ômega-3 no corpo ao longo dos meses anteriores.
Resultados e achados principais
Os resultados revelaram diferenças marcantes entre os grupos:
| Grupo | Índice Ômega-3 (O3I %) | Ingestão de EPA+DHA (mg/dia) |
|---|---|---|
| Veganos | 3,7 ± 1,1 | 10 ± 40 |
| Lacto-ovo vegetarianos | 3,9 ± 1,3 | 18 ± 54 |
| Pesco-vegetarianos | 5,7 ± 2,1 | 158 ± 279 |
| Não vegetarianos | 5,0 ± 1,3 | 117 ± 91 |
Os valores abaixo de 4%, observados nos grupos vegano e lacto-ovo vegetariano, indicam maior vulnerabilidade a eventos cardiovasculares e inflamação crônica sistêmica. De forma comparativa, índices entre 6% e 8% são considerados ideais para proteção cardíaca e cerebral, segundo parâmetros internacionais estabelecidos por Harris e von Schacky.
Desfechos negativos e implicações clínicas
Os pesquisadores identificaram uma deficiência significativa de EPA e DHA nas hemácias de indivíduos que não consomem peixe ou carne, mesmo quando a ingestão de gorduras vegetais era elevada. A principal explicação é a baixa conversão do ácido alfa-linolênico (ALA), presente em sementes e óleos vegetais, para suas formas biologicamente ativas (EPA e DHA). Em humanos, essa conversão raramente ultrapassa 5%, o que torna o aporte direto por alimentos marinhos essencial.
Essa deficiência pode gerar diversos efeitos deletérios, como:
- Aumento da inflamação de baixo grau, associada a doenças cardiovasculares e autoimunes.
- Alterações na fluidez das membranas neuronais, prejudicando memória, atenção e regulação do humor.
- Maior risco de triglicerídeos elevados, aritmias e rigidez arterial.
- Potencial comprometimento do desenvolvimento cognitivo e da função visual em populações com baixa ingestão de DHA.
Nos participantes vegetarianos e veganos, o padrão alimentar resultou em níveis de ômega-3 equivalentes aos encontrados em populações de alto risco metabólico, mesmo com consumo calórico adequado e ausência de obesidade. Isso reforça que a qualidade da gordura ingerida é tão importante quanto a quantidade.
Interpretação dos autores
Segundo os pesquisadores, os dados indicam que a exclusão completa de alimentos de origem animal compromete a manutenção de níveis adequados de EPA e DHA, o que pode impactar negativamente a saúde a longo prazo. Mesmo dietas equilibradas em calorias e ricas em vegetais não conseguem garantir o mesmo estado metabólico obtido com fontes animais de ômega-3.
Os autores afirmam que a ingestão vegetal isolada não substitui a função biológica do EPA e do DHA. As alternativas mais eficazes para vegetarianos seriam os óleos derivados de microalgas, que contêm DHA biodisponível, embora ainda sejam de custo elevado e uso restrito.
Conclusão
O estudo reforça uma constatação observada em outras pesquisas: a ausência de alimentos marinhos e carnes na dieta reduz de forma importante o índice ômega-3, fator de risco independente para mortalidade cardiovascular e declínio cognitivo.
Enquanto pesco-vegetarianos apresentaram os melhores resultados, os veganos e lacto-ovo vegetarianos permaneceram abaixo do limite considerado protetor, indicando um estado potencial de deficiência crônica.
Esses achados apontam a necessidade de monitorar os biomarcadores lipídicos e, quando necessário, repor o DHA e o EPA de forma adequada. A longo prazo, ignorar essa deficiência pode representar um custo metabólico e cardiovascular significativo.
