A verdade sobre a metionina, homocisteína e a dieta carnívora


Um mito que ganhou força sem base real

Há quem diga que comer muita carne pode “entupir” as artérias ou causar disfunção endotelial — o comprometimento da camada interna dos vasos sanguíneos — porque a carne contém metionina, um aminoácido essencial. Segundo essa teoria, o excesso de metionina aumentaria a homocisteína no sangue, que por sua vez danificaria o endotélio por meio de vias metabólicas ligadas à enzima mTOR.

Essa ideia parece técnica, mas simplificando: seria como dizer que comer carne faz o corpo produzir uma substância tóxica que agride os vasos. O problema é que essa hipótese nunca foi confirmada em humanos.

O papel real da metionina e da homocisteína

A metionina é um aminoácido essencial, ou seja, o corpo não consegue produzi-la sozinho. Ela participa de processos vitais como síntese de proteínas, regeneração de tecidos, produção de antioxidantes (como a glutationa) e controle da metilação do DNA, fundamental para o funcionamento celular.

Durante essas reações, parte da metionina é convertida em homocisteína, uma molécula intermediária que, quando não reciclada adequadamente, pode se acumular. Porém, o corpo possui mecanismos naturais de equilíbrio, que dependem de vitaminas como B6, B12 e folato para transformar a homocisteína novamente em metionina ou em cisteína — um aminoácido inofensivo e necessário.

Em outras palavras, a homocisteína só se eleva quando faltam essas vitaminas, e não porque alguém comeu carne demais.

O que mostram os estudos científicos

O trabalho clássico de Mann et al. (1999) comparou quatro grupos de homens: veganos, vegetarianos, moderados e grandes consumidores de carne. O resultado foi o oposto do mito:

  • os que comiam mais carne tinham maiores níveis de vitamina B12 e menores níveis de homocisteína;
  • veganos e vegetarianos, com pouca ou nenhuma ingestão de produtos animais, apresentaram homocisteína significativamente mais alta, mesmo com menor ingestão de metionina (Mann NJ et al., Eur J Clin Nutr, 1999).

A mesma conclusão foi reforçada pela meta-análise de Obersby et al. (2013), que avaliou mais de 3.000 pessoas:

“As dietas que excluem produtos de origem animal elevam os níveis de homocisteína devido à deficiência de vitamina B12, não por excesso de metionina.”
(Obersby D et al., Br J Nutr, 2013)

De forma global, Elmadfa & Singer (2009) confirmaram que vegetarianos e veganos têm níveis mais baixos de vitamina B12 e mais altos de homocisteína do que onívoros, com risco aumentado de alterações cardiovasculares
(Elmadfa I & Singer I, Am J Clin Nutr, 2009).

Ou seja, não é o consumo de carne que eleva a homocisteína — é justamente a falta de alimentos de origem animal que remove os nutrientes necessários para controlá-la.

A glicina: o contrapeso natural da metionina

Outro ponto importante é o equilíbrio natural de aminoácidos na carne. A teoria do “excesso de metionina” ignora que os tecidos animais contêm muita glicina, aminoácido que atua como contrapeso metabólico da metionina.

Segundo a Base de Dados de Metionina e Glicina nos Alimentos e a obra Ciência da Carne de R.A. Lawrie, cortes comuns como músculo bovino, frango e peixe contêm quantidades semelhantes ou até maiores de glicina que de metionina, especialmente quando se consomem partes ricas em colágeno, como tendões, cartilagens ou caldos de osso.

Além disso, o estudo clássico de Cook (1971) demonstrou que a absorção de glicina é prejudicada pela presença de açúcar e galactose, o que significa que dietas ricas em carboidratos podem limitar esse equilíbrio (Cook GC, J Physiol, 1971).

Dietas com menos açúcar — como a carnívora — tendem a melhorar a absorção e o aproveitamento da glicina, reforçando o equilíbrio natural entre esses aminoácidos.

E o mTOR?

A enzima mTOR (mammalian target of rapamycin) é frequentemente apontada como um “culpado” por envelhecimento e doenças vasculares quando ativada por proteínas. No entanto, essa interpretação é simplista.

O artigo de Lee et al. (2016), publicado na Annals of the New York Academy of Sciences, explica que a mTOR é um regulador natural do crescimento celular e da renovação tecidual. Ela não é “boa” ou “má”: seu papel depende do contexto. Em condições de excesso calórico, sedentarismo e inflamação crônica, sua ativação constante pode ser prejudicial. Mas em dietas equilibradas, com adequada ingestão proteica e baixo consumo de açúcar, o funcionamento da mTOR é fisiológico e necessário
(Lee BC & Gladyshev VN, Ann N Y Acad Sci, 2016).

O que realmente causa disfunção endotelial

A verdadeira disfunção endotelial está relacionada a resistência à insulina, glicação avançada, inflamação crônica e estresse oxidativo — condições associadas ao excesso de carboidratos refinados e não à ingestão de carne.

Estudos mostram que a homocisteína só se torna problema quando há deficiência de vitaminas do complexo B, tabagismo, alcoolismo, doenças renais ou hiperglicemia persistente — não por consumo de proteínas animais.

Na verdade, ao incluir carne, ovos e vísceras, o corpo recebe todas as vitaminas e cofatores necessários para manter a metionina, a homocisteína e a glicina em perfeito equilíbrio.

A visão prática

Quem adota uma dieta à base de alimentos animais — seja carnívora, cetogênica ou de baixo carboidrato — naturalmente ingere metionina, glicina e vitaminas B6, B12 e folato em proporções ideais. Além disso, ao reduzir carboidratos, melhora a absorção de glicina e diminui processos inflamatórios que afetam o endotélio.

Portanto, a hipótese de que a dieta carnívora cause disfunção endotelial por excesso de metionina não encontra respaldo em nenhuma evidência clínica humana. É um mito originado de extrapolações de estudos com roedores alimentados com rações artificiais, sem relevância para o metabolismo humano.

Conclusão

A metionina não é vilã. Ela é um nutriente essencial e funciona dentro de um sistema equilibrado, no qual a glicina e as vitaminas do complexo B garantem o controle natural da homocisteína.
Quem consome carne obtém justamente os elementos necessários para esse equilíbrio.

O problema não é a carne, mas a deficiência nutricional causada pela exclusão dos alimentos animais que fornecem os cofatores vitais para o metabolismo do enxofre.

A ciência é clara: as dietas ricas em carne não provocam disfunção endotelial — elas a previnem.

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