Decifrando os efeitos dos análogos vegetais da carne: um alerta sobre riscos à saúde


Nos últimos anos, análogos vegetais da carne (PBMAs, do inglês plant-based meat analogues) ganharam espaço no mercado com a promessa de substituir a carne animal sem prejuízo nutricional. Para avaliar os impactos metabólicos desses produtos, um estudo experimental publicado no Journal of Agricultural and Food Chemistry (doi:10.1021/acs.jafc.5c02799) investigou os efeitos de dietas contendo carne bovina, seitan (glúten de trigo) ou tofu (soja) em ratos Wistar ao longo de 10 semanas.

Os resultados revelaram uma série de efeitos negativos associados ao consumo de seitan e tofu comerciais, sugerindo que esses produtos ultraprocessados não oferecem a mesma qualidade metabólica da carne bovina.

Alterações na microbiota intestinal

A microbiota dos animais alimentados com tofu e seitan sofreu mudanças importantes:

  • Houve redução acentuada de Lactobacillus gasseri, bactéria considerada benéfica e associada à saúde intestinal.
  • Ocorreu aumento de microrganismos potencialmente nocivos, como Escherichia–Shigella (até 30 vezes mais abundante em tofu), Desulfovibrio e Parasutterella.
  • Essas alterações configuram um quadro de disbiose intestinal, marcado por desequilíbrio bacteriano que pode predispor a inflamações e produção de compostos tóxicos.

Proteínas oxidadas e estresse oxidativo

Outro ponto crítico identificado foi o estado das proteínas presentes nas rações.

  • As dietas com PBMAs continham proteínas mais oxidadas e agregadas, tornando-as menos digeríveis.
  • No sangue dos animais, foram detectados níveis elevados de marcadores de oxidação, como PPCs, TBARs e pentosidina (particularmente no grupo seitan).
  • Esses achados refletem maior estresse oxidativo sistêmico, condição associada a envelhecimento precoce e desenvolvimento de doenças crônicas.

Produção de metabólitos tóxicos

A fermentação intestinal de proteínas mal digeridas levou ao acúmulo de substâncias com potencial tóxico:

  • p-cresol, elevado no grupo tofu, é associado a disfunções intestinais e hepáticas.
  • Skatol, encontrado em maior quantidade no seitan, está relacionado a toxicidade celular.
  • Indóis e derivados, presentes em ambos os grupos com PBMAs, reforçam a ideia de fermentação proteica excessiva, um processo desfavorável à saúde metabólica.

Alterações hepáticas e metabólicas

Os resultados bioquímicos mostraram que os PBMAs impactaram negativamente o fígado e o metabolismo dos animais:

  • O grupo seitan apresentou ALT, AST/GOT e ALP elevados, marcadores de sofrimento hepático.
  • Ureia sérica aumentada indicou sobrecarga no metabolismo proteico.
  • O perfil lipídico foi alterado: houve elevação do LDL em seitan, ao passo que triglicerídeos diminuíram nos PBMAs, mas sem efeito considerado positivo diante do cenário de estresse oxidativo.

Perturbações nas vias de purinas

O estudo identificou ainda um fenômeno inesperado no metabolismo de purinas nos animais que receberam seitan:

  • Houve aumento na excreção urinária de xantina e hipoxantina, sem elevação do ácido úrico.
  • Os autores destacam a presença de um composto semelhante ao alopurinol, sugerindo possível interferência na enzima xantina oxidoredutase, responsável pelo metabolismo dessas moléculas.
  • Essa alteração pode indicar efeito farmacológico indesejado dos componentes do seitan.

Conclusão

O estudo demonstrou que, em modelo animal, o consumo de análogos vegetais da carne não reproduz os efeitos metabólicos da carne bovina. Pelo contrário, revelou consequências preocupantes:

  • Disbiose intestinal com aumento de bactérias potencialmente patogênicas.
  • Acentuado estresse oxidativo associado a proteínas oxidadas.
  • Produção de metabólitos tóxicos como p-cresol e skatol.
  • Sinais de dano hepático e alterações enzimáticas.
  • Perturbações metabólicas em vias essenciais, incluindo o catabolismo de purinas.

Esses resultados levantam dúvidas sobre a segurança do consumo prolongado de PBMAs ultraprocessados como substitutos da carne. Embora o estudo tenha sido realizado em ratos e não permita extrapolação direta para humanos, ele aponta para riscos que justificam cautela. Estudos clínicos futuros serão fundamentais para compreender os impactos reais desses produtos na saúde humana.

Fonte: https://doi.org/10.1021/acs.jafc.5c02799

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