Um grupo de pesquisadores sul-africanos analisou o que acontece no corpo de crianças pequenas com excesso de vitamina A. Eles queriam descobrir como o sangue dessas crianças muda e quais substâncias poderiam indicar que há acúmulo de vitamina A antes mesmo de surgirem sintomas.
A vitamina A é essencial, mas o excesso pode ser perigoso. E, em alguns países, há três fontes principais que se somam:
- Alimentos fortificados, como farinha e fubá.
- Suplementos em altas doses, dados em campanhas de saúde.
- Consumo de fígado, que naturalmente tem muita vitamina A.
O estudo mostrou que o problema não está em um único fator, mas na soma de todos eles.
Como o estudo foi feito
Foram avaliadas 30 crianças entre 2 e 5 anos, divididas em dois grupos:
- Um com níveis normais de vitamina A no fígado.
- Outro com acúmulo excessivo (hipervitaminose A).
Todas receberam uma dose alta de vitamina A (200.000 UI) e tiveram o sangue analisado antes e 28 dias depois.
Com técnicas modernas de laboratório (chamadas de metabolômica), os cientistas mediram pequenas moléculas de gordura do sangue, conhecidas como lipídios, para ver quais mudavam com o excesso de vitamina A.
O que eles encontraram
As crianças com muita vitamina A acumulada apresentaram mudanças nos lipídios do sangue, especialmente em dois grupos de moléculas:
Fosfolipídios e lisofosfolipídios — que fazem parte das membranas das células.
- Em crianças com excesso de vitamina A, essas moléculas estavam mais baixas, o que indica mudanças na estrutura celular.
- Oxilipinas — substâncias derivadas de ácidos graxos que regulam inflamações e defesas do corpo.
- Depois da suplementação, elas diminuíram, sugerindo que altas doses de vitamina A podem interferir temporariamente em processos inflamatórios e de sinalização do organismo.
Curiosamente, o retinol no sangue (a forma circulante da vitamina A) não mudou muito, mesmo nas crianças com excesso.
Isso mostra que exames de sangue comuns podem não detectar o problema, já que o corpo mantém o retinol em níveis estáveis até que o fígado esteja sobrecarregado.
O que isso significa na prática
Esse estudo mostrou que é possível identificar pistas precoces de excesso de vitamina A observando mudanças em certos tipos de gordura do sangue, muito antes de qualquer sintoma aparecer.
Os resultados também ajudam a entender por que algumas crianças acabam com hipervitaminose mesmo sem exagerar em um único alimento.
O excesso é resultado da soma de fatores:
- Suplementação em megadoses (muito acima das necessidades diárias).
- Fortificação de alimentos básicos com vitamina A.
- Consumo regular de fígado (naturalmente muito rico em retinol).
Quando essas três fontes se combinam, o corpo pode acumular vitamina A demais no fígado, aumentando o risco de efeitos tóxicos — como náuseas, dor de cabeça, irritabilidade e, em casos graves, lesão hepática.
O que o estudo não quer dizer
Os autores deixam claro que comer fígado ocasionalmente não é perigoso.
O problema surge quando há acúmulo, o que acontece em populações que já recebem suplementos e alimentos fortificados.
Também é importante notar que o estudo foi pequeno (30 crianças) e serviu para gerar pistas, não conclusões definitivas.
Mesmo assim, ele ajuda a repensar como os programas de suplementação e fortificação são aplicados em locais onde o consumo de alimentos ricos em vitamina A já é comum.
Conclusão
O estudo mostra que o excesso de vitamina A pode alterar o metabolismo do corpo de forma silenciosa, sem mudar o resultado de exames simples.
As descobertas indicam que, no futuro, novos exames baseados em perfis lipídicos podem ajudar a identificar quem está com acúmulo de vitamina A antes que o problema se torne grave.
Mais importante: ele reforça que o fígado em si não é o vilão. O risco real está na combinação de muitas fontes de vitamina A — suplementação, fortificação e dieta rica — aplicadas sem acompanhamento individual.
Fonte: https://doi.org/10.1017/S0007114525103656
