O conceito de que doenças metabólicas, como diabetes tipo 2, resistência à insulina e esteatose hepática, dependem exclusivamente do consumo elevado de carboidratos e açúcares vem sendo desafiado por novas evidências científicas. Um estudo recente demonstrou que, mesmo com baixa ingestão de carboidratos, o consumo frequente de óleos vegetais ricos em ácidos graxos poli-insaturados — como soja, milho, girassol e canola — pode desencadear alterações metabólicas importantes.
O problema central está na instabilidade química desses óleos. Por possuírem várias ligações duplas em sua estrutura, essas gorduras oxidam com facilidade quando:
- São submetidas a altas temperaturas em frituras, assados ou refogados.
- Permanecem armazenadas por longos períodos, favorecendo degradação oxidativa.
Durante a oxidação, ocorre a quebra das moléculas de gordura, resultando na formação de compostos altamente reativos chamados aldeídos reativos. Entre eles, o 4-hidroxinonenal (4-HNE) tem destaque por seu alto potencial de dano celular.
O estudo avaliou dois modelos:
- Ilhotas pancreáticas de camundongos NOD pré-diabéticos – que apresentam inflamação nas ilhotas antes da destruição autoimune total.
- Culturas de células β (MIN6 e INS-1 GRINCH) – expostas diretamente ao 4-HNE ou a um coquetel de citocinas inflamatórias (IL-1β, IFNγ e TNFα).
A análise utilizou técnicas de proteômica de alta resolução para identificar e quantificar proteínas modificadas por carbonilação proteica — reação irreversível em que o 4-HNE se liga a resíduos de cisteína, lisina ou histidina de proteínas, alterando sua estrutura e função.
Principais resultados:
- Nas ilhotas dos camundongos NOD, foram identificadas 1.243 proteínas carboniladas, sendo 96% com aumento ≥ 2 vezes em relação aos controles. Muitas dessas proteínas estão envolvidas em tráfego vesicular, exocitose e endocitose — processos essenciais para a secreção de insulina.
- A exposição das células β ao 4-HNE reduziu a secreção de insulina em aproximadamente 50% em apenas 5 minutos, demonstrando um efeito rápido e direto, não dependente de mudanças na expressão gênica.
- Entre as proteínas mais afetadas estavam diversas Rab GTPases (reguladoras do tráfego de vesículas), Munc18-1, NSF, complexo AP2 e até a própria insulina/proinsulina.
- As citocinas pró-inflamatórias também induziram carbonilação, mas com padrão diferente: afetaram, além das proteínas de tráfego, componentes mitocondriais e do retículo endoplasmático, condizente com produção interna de espécies reativas de oxigênio.
- O padrão observado nas ilhotas NOD foi uma combinação dos dois mecanismos: danos por compostos derivados externamente (como o 4-HNE dos óleos oxidados) e internamente (por inflamação).
Implicações clínicas:
Mesmo sem excesso de carboidratos, a ingestão regular de óleos vegetais poli-insaturados — especialmente quando submetidos ao calor — pode introduzir ou gerar no organismo 4-HNE em níveis suficientes para comprometer a função pancreática. Esse dano:
- Reduz a capacidade de liberação de insulina.
- Afeta o metabolismo energético celular, prejudicando mitocôndrias.
- Favorece processos inflamatórios persistentes.
O estudo reforça que a análise de risco metabólico deve considerar não apenas macronutrientes como carboidratos, mas também a qualidade e estabilidade das gorduras ingeridas. A presença crônica de compostos como o 4-HNE pode representar um elo entre consumo de óleos vegetais e desenvolvimento de doenças metabólicas, independentemente da carga glicêmica da dieta.
Fonte: https://doi.org/10.1101/2025.07.23.666010
