Colesterol LDL elevado, baixo risco? O fenótipo "Lean Mass Hyper-Responder" – uma revisão da literatura


O artigo revisa um fenômeno cada vez mais discutido entre praticantes de dietas com baixo consumo de carboidratos, como a cetogênica ou a carnívora: o chamado fenótipo Lean Mass Hyper-Responder (LMHR). Esse grupo apresenta um perfil lipídico peculiar, caracterizado por colesterol LDL acima de 200 mg/dL, colesterol HDL acima de 80 mg/dL e triglicerídeos abaixo de 70 mg/dL, em indivíduos geralmente magros, com baixo percentual de gordura corporal e nível de atividade física moderado ou elevado.

Contexto e relevância clínica

A doença isquêmica do coração continua sendo a principal causa de morte no mundo, e desde o Framingham Heart Study o colesterol LDL é considerado um fator de risco para aterosclerose. Tradicionalmente, níveis elevados de LDL estão ligados a maior risco de eventos cardiovasculares. Porém, em pessoas com fenótipo LMHR, essa associação não parece seguir o mesmo padrão.

Modelo energético lipídico

A explicação mais aceita para esse perfil é o Lipid Energy Model (LEM). Segundo ele, ao restringir carboidratos, o corpo passa a depender intensamente dos ácidos graxos e das lipoproteínas ricas em triglicerídeos como principal fonte de energia. Isso leva a um aumento do fluxo de VLDL (lipoproteínas de densidade muito baixa), que ao serem metabolizadas acabam elevando o LDL. Curiosamente, estudos mostram relação inversa entre IMC e LDL em LMHR, ou seja, quanto mais magro o indivíduo, maior tende a ser seu LDL sob restrição de carboidratos.

Evidências clínicas

Estudos recentes com angiotomografia coronariana (CCTA) não encontraram diferenças significativas no volume de placas ateroscleróticas entre LMHR e controles ajustados por idade, sexo e fatores de risco, mesmo diante de LDL extremamente elevado. O estudo KETO-CTA, por exemplo, acompanhou 100 indivíduos com LMHR por 1 ano e não observou correlação entre LDL e progressão de aterosclerose; o fator preditor mais relevante foi a presença prévia de placa. Outro estudo comparando LMHR com a coorte Miami Heart também não encontrou diferença estatística na carga de placa ou calcificação coronariana.

Limitações das evidências

Apesar dos achados intrigantes, os estudos apresentam limitações importantes: tamanho reduzido da amostra, autoseleção dos participantes, ausência de grupo comparativo em alguns trabalhos e tempo de acompanhamento curto. Além disso, dados de estudos observacionais mais amplos sugerem que dietas muito baixas em carboidratos (<130 g/dia) estão associadas a maior mortalidade por todas as causas, embora não haja associação consistente com mortalidade cardiovascular.

Conclusão

O fenótipo LMHR representa um desafio ao modelo clássico de avaliação de risco cardiovascular, já que combina LDL muito elevado com marcadores tradicionalmente protetores (HDL alto e triglicerídeos baixos). As evidências disponíveis indicam heterogeneidade, e ainda não está claro se esse perfil representa uma adaptação metabólica inofensiva ou um risco cardiovascular real a longo prazo. Até que estudos prospectivos de longo prazo confirmem sua segurança, recomenda-se cautela: a interpretação clínica deve ir além do LDL isolado, incluindo perfil lipídico completo, marcadores inflamatórios e imagem vascular.

Fonte: https://doi.org/10.12775/QS.2025.43.61260

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