A crescente adoção de dietas vegetarianas e veganas por crianças e adolescentes tem levantado preocupações sobre possíveis deficiências nutricionais, especialmente no que diz respeito aos oligoelementos essenciais como selênio, zinco e cobre. O estudo VeChi Youth, publicado em 2025 no European Journal of Nutrition, investigou justamente essa questão, analisando os níveis desses minerais em jovens de 6 a 18 anos com diferentes padrões alimentares.
Contexto e objetivo do estudo
Selênio, zinco e cobre são micronutrientes fundamentais para o crescimento, maturação sexual, função imunológica, metabolismo oxidativo e desenvolvimento neurológico. Como esses elementos são predominantemente encontrados em alimentos de origem animal — como carne, peixe, ovos e laticínios — a exclusão desses itens da dieta pode comprometer sua ingestão adequada.
O objetivo do estudo foi avaliar a ingestão e o status sérico desses minerais em 324 participantes saudáveis, distribuídos entre veganos (n=86), vegetarianos (n=120) e onívoros (n=118), utilizando registros alimentares de três dias e biomarcadores sanguíneos, como:
- Selênio total no soro
- Selenoproteína P (SELENOP)
- Atividade da glutationa peroxidase-3 (GPX3)
- Zinco sérico
- Cobre sérico
- Atividade oxidase da ceruloplasmina (CPO)
Resultados principais
Ingestão dietética
- Selênio: A ingestão foi significativamente menor entre os veganos (31 µg/dia) em comparação aos onívoros (44,6 µg/dia; p<0,0001). Mesmo assim, todos os grupos ficaram abaixo das recomendações europeias para suas faixas etárias.
- Zinco: A menor ingestão foi observada nos veganos (8,1 mg/dia), seguida por vegetarianos e onívoros. Contudo, a diferença entre os grupos não foi estatisticamente significativa.
- Cobre: A ingestão foi maior em vegetarianos (2,2 mg/dia) do que em onívoros (1,7 mg/dia; p<0,0001). Veganos ficaram com valores intermediários.
Status sanguíneo
- Selênio sérico e SELENOP: Veganos e vegetarianos apresentaram níveis significativamente mais baixos que onívoros. A SELENOP foi especialmente sensível à diferença de ingestão.
- GPX3: Atividade enzimática inferior foi observada entre vegetarianos em relação aos onívoros.
- Zinco sérico: Níveis mais baixos em vegetarianos (p=0,0016) e veganos (p=0,0122) em comparação a onívoros.
- Cobre sérico e CPO: Não foram observadas diferenças significativas entre os grupos.
Importância dos biomarcadores funcionais
A análise de SELENOP e GPX3 foi fundamental para indicar não apenas a presença do selênio no organismo, mas sua funcionalidade. Enquanto o selênio total reflete todas as formas circulantes, a SELENOP oferece uma medida mais sensível da disponibilidade biológica.
Discussão e implicações clínicas
A principal preocupação revelada pelo estudo é que tanto vegetarianos quanto veganos demonstram menor ingestão e menores níveis séricos de selênio e zinco. No caso do zinco, isso pode ser agravado pela menor biodisponibilidade em dietas ricas em fitatos (presentes em grãos e leguminosas), que prejudicam sua absorção intestinal. Apesar da maior ingestão de cobre em dietas baseadas em plantas, isso não resultou em diferenças significativas nos biomarcadores séricos, o que pode ser explicado pela regulação homeostática eficiente do cobre.
Outro achado importante é que, mesmo entre onívoros, a ingestão de selênio foi subótima. Isso pode estar relacionado aos baixos níveis de selênio no solo europeu e à predominância de alimentos processados pobres nesse nutriente. Nos grupos vegano e vegetariano, a ingestão foi ainda mais comprometida, e a suplementação — embora mais comum entre os veganos — não foi considerada nos cálculos principais.
Conclusão
O estudo reforça a necessidade de monitoramento cuidadoso do status nutricional de selênio e zinco em crianças e adolescentes que seguem dietas vegetarianas ou veganas. Embora o cobre não pareça representar risco, os déficits potenciais de selênio e zinco podem ter implicações funcionais importantes, especialmente durante o crescimento e a puberdade. Os autores recomendam planejamento alimentar rigoroso e, quando necessário, suplementação orientada.
O trabalho destaca a importância de não apenas medir ingestão, mas avaliar biomarcadores funcionais para compreender a real adequação nutricional em populações pediátricas com padrões alimentares restritivos.
