A discussão sobre o papel da carne vermelha na saúde humana tem sido marcada por controvérsias e visões conflitantes. Em especial, a carne vermelha não processada (CVNP), frequentemente confundida com produtos processados como embutidos, é alvo de interpretações equivocadas. Um novo estudo publicado em 2025 na revista Obesity lança luz sobre essa questão ao avaliar, com critérios rigorosos, o impacto da ingestão de CVNP sobre obesidade e parâmetros metabólicos relacionados.
A relevância da análise
Historicamente, muitas recomendações dietéticas que desestimulam o consumo de carne vermelha foram baseadas em estudos observacionais, os quais, embora úteis, não são capazes de estabelecer causa e efeito. Além disso, esses estudos frequentemente dependem de relatos dietéticos autorreferidos, reconhecidamente imprecisos. Diante desse cenário, os autores decidiram realizar uma revisão sistemática e meta-análise exclusivamente de ensaios clínicos randomizados (ECR), o padrão-ouro para avaliar intervenções em saúde.
Metodologia do estudo
Foram incluídos 24 ensaios clínicos envolvendo apenas adultos, com grupos de intervenção que consumiram carne vermelha não processada (derivada de boi, porco, cordeiro ou cavalo) e grupos controle com outras fontes proteicas ou padrões dietéticos. As variáveis avaliadas incluíram:
- Índice de massa corporal (IMC)
- Peso corporal
- Percentual de gordura corporal
- Perfil lipídico: colesterol total, LDL, HDL e triglicerídeos
Os dados foram analisados utilizando modelos estatísticos robustos, incluindo modelos de efeitos aleatórios e análise de sensibilidade. A qualidade dos estudos foi avaliada pela ferramenta da Cochrane, e os riscos de viés e viés de publicação foram examinados.
Resultados principais
Os achados da análise foram consistentes: não houve efeito significativo da carne vermelha não processada sobre peso, IMC ou percentual de gordura corporal. Especificamente:
- As estimativas de efeito combinadas mostraram intervalos de confiança que incluíam o valor nulo (sem efeito), tanto para peso quanto para gordura corporal e IMC.
- Também não houve impacto significativo sobre HDL ou triglicerídeos.
- Pequenos efeitos adversos sobre LDL e colesterol total foram observados apenas após filtragem estatística para o pior cenário (maior efeito negativo), mas os autores consideram esses efeitos pequenos e possivelmente sem relevância clínica.
Implicações clínicas
Esses achados desafiam a suposição comum de que o consumo de carne vermelha não processada promove ganho de peso ou obesidade. De fato, os próprios autores destacam que:
“Não observamos qualquer efeito adverso da carne vermelha não processada sobre o ganho de peso, obesidade ou condições metabólicas relacionadas.”
Além disso, considerando que alimentos ricos em proteína, como a carne vermelha magra, contribuem para a saciedade e ajudam na adesão a dietas hipocalóricas, seu uso estratégico pode ser benéfico em programas de perda de peso.
Vale lembrar que, para uma mesma quantidade de proteína, a carne vermelha magra fornece menos calorias por porção que fontes como laticínios integrais, nozes e leguminosas. Assim, seu papel na alimentação deve ser avaliado com base em dados atualizados e específicos, como os oferecidos por esta análise.
Limitações
Apesar da metodologia rigorosa, o estudo possui algumas limitações:
- Não foram considerados ensaios clínicos com crianças.
- A maioria dos estudos incluídos apresentou algum risco de viés.
- Não se avaliou o impacto de variáveis como frequência de consumo, horário das refeições ou combinações alimentares.
- Os estudos analisados tinham curta duração, o que pode não capturar efeitos cumulativos a longo prazo.
Considerações finais
A presente revisão sistemática ajuda a elucidar uma área cercada de desinformação e generalizações precipitadas. Ao excluir estudos observacionais e focar apenas em ensaios clínicos, os autores oferecem evidência mais sólida para apoiar decisões clínicas e diretrizes alimentares. A conclusão central é clara: o consumo de carne vermelha não processada, por si só, não está associado ao aumento de peso ou obesidade em adultos.
Para profissionais de saúde, isso significa que a carne vermelha magra, especialmente em sua forma não processada, pode ser incorporada com segurança em padrões alimentares saudáveis, respeitando as necessidades e preferências individuais de cada paciente.
Fonte: https://doi.org/10.1002/oby.24322
