Associação entre a Ingestão de Proteína e o Risco de Doença Renal Diabética: o Papel Protetor de Aminoácidos Cetogênicos


A doença renal diabética (DRD) é uma das complicações mais frequentes do diabetes tipo 2 (DM2), atingindo até 40% dos pacientes ao longo da vida. Com o aumento global da prevalência de diabetes, torna-se essencial entender como fatores dietéticos influenciam o risco e a progressão dessa condição. Um estudo transversal recente publicado no periódico Nutrients em junho de 2025 avaliou justamente esse ponto: a relação entre o consumo de proteínas — e, mais importante, o perfil de aminoácidos — com o risco de DRD em adultos com DM2.

Objetivo do Estudo

O objetivo principal foi investigar como a quantidade e a qualidade da proteína dietética — em especial, o consumo de aminoácidos específicos — se relacionam com o risco de DRD em indivíduos com DM2. O estudo examinou 378 pacientes taiwaneses, divididos em três grupos com base no consumo proteico ajustado ao peso corporal:

  • Grupo 1: ≤0,8 g/kg
  • Grupo 2: 0,9–1,2 g/kg
  • Grupo 3: ≥1,3 g/kg

Além da ingestão proteica total, os pesquisadores avaliaram perfis de aminoácidos, com foco em três parâmetros:

  1. Aminoácidos de cadeia ramificada (BCAA: leucina, isoleucina e valina)
  2. Aminoácidos aromáticos (AAA: fenilalanina, tirosina e triptofano)
  3. Aminoácidos cetogênicos (principalmente leucina e lisina)

Principais Descobertas

1. Ingestão de Proteína e Risco de DRD

Surpreendentemente, o estudo não encontrou associação estatisticamente significativa entre o consumo total de proteína e o risco de DRD quando os participantes foram comparados apenas pela quantidade ingerida. No entanto, observou-se uma tendência favorável à sobrevivência sem DRD no grupo com ingestão moderada de proteína (0,9–1,2 g/kg/dia).

2. Aminoácidos Cetogênicos como Fatores Protetores

O achado mais consistente e relevante foi a associação inversa entre o consumo de aminoácidos cetogênicos — leucina e lisina — e o risco de DRD. Mesmo após ajustes para idade, sexo, tempo de diabetes e pressão arterial, a ingestão mais elevada desses aminoácidos continuou significativamente associada a menor risco renal.

Os resultados sugerem que não é apenas a quantidade de proteína que importa, mas a composição de aminoácidos. Leucina e lisina, por serem exclusivamente cetogênicas, não aumentam a carga de nitrogênio e podem modular vias inflamatórias e de estresse oxidativo benéficas à função renal.

3. BCAA e AAA também Mostraram Efeitos Benéficos

Tanto os BCAA quanto os AAA foram associados à redução do risco de DRD em análises contínuas. Ainda que a razão BCAA/AAA não tenha sido estatisticamente significativa, seus componentes individualmente mostraram efeitos protetores, principalmente nos grupos com consumo proteico baixo a moderado.

Discussão e Implicações Clínicas

A maior relevância deste estudo está em reforçar a importância de considerar a qualidade da proteína, e não apenas sua quantidade, em dietas voltadas à prevenção de complicações renais no DM2.

Diversos mecanismos podem explicar os benefícios dos aminoácidos cetogênicos:

  • Menor geração de ureia e toxinas nitrogenadas
  • Modulação de vias inflamatórias como NF-κB e MAPK
  • Papel anabólico e regenerativo sobre o tecido muscular
  • Potencial de redução de estresse oxidativo

Além disso, os achados desafiam a recomendação tradicional de restrição proteica universal em pacientes com risco de DRD. Em vez disso, apontam para a possibilidade de dietas com proteína de qualidade superior — particularmente rica em leucina e lisina — como alternativas viáveis, seguras e possivelmente protetoras.

Limitações do Estudo

Embora os resultados sejam promissores, trata-se de um estudo transversal. Assim, não é possível estabelecer causalidade, apenas associação. Outras limitações incluem:

  • Uso de questionário alimentar (FFQ), sujeito a viés de memória
  • Ausência de dados detalhados sobre medicamentos antidiabéticos
  • Tamanho reduzido no grupo de alta ingestão proteica
  • Falta de avaliação longitudinal para acompanhar progressão renal

Conclusão

Este estudo destaca a importância dos perfis de aminoácidos na prevenção da doença renal diabética em pessoas com diabetes tipo 2. A ingestão moderada de proteína, especialmente com foco em aminoácidos cetogênicos como leucina e lisina, pode oferecer proteção renal relevante. Esses achados apontam para a necessidade de reavaliar diretrizes nutricionais que focam apenas na restrição proteica quantitativa, sugerindo que intervenções personalizadas com base na qualidade da proteína podem ser mais eficazes.

Novos estudos clínicos randomizados e longitudinais são necessários para validar essas associações e traduzir os achados em recomendações práticas.

Fonte: https://doi.org/10.3390/nu17132168

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