Impactos à saúde de dietas com restrição de proteína, sem déficit calórico, ricas em carboidratos para indução de FGF21


Dietas com restrição proteica que mantêm o equilíbrio energético e são complementadas por alto teor de carboidratos vêm sendo investigadas por seu potencial de induzir o hormônio FGF21 (fibroblast growth factor 21), implicado na regulação da homeostase energética, sensibilidade à insulina e preferências alimentares. Estudos recentes em humanos e modelos animais elucidam tanto os mecanismos de indução quanto os possíveis impactos à saúde a médio e longo prazo.

1. Indução robusta de FGF21 por restrição proteica e alta ingestão de carboidratos

Estudos clínicos controlados demonstram que dietas eucalóricas com baixo teor proteico, substituindo calorias provenientes de proteínas por carboidratos (LPHC), aumentam significativamente os níveis de FGF21 em adultos saudáveis. Um ensaio em homens magros submetidos por cinco semanas a dieta com proteína restrita (mínimo requerido) revelou elevação de cerca de 270 % nos níveis de FGF21 em jejum, acompanhada de incremento de ~20 % na ingestão de energia para manter o peso corporal (nature.com). Esses resultados confirmam que, independentemente de substituir proteína por carboidratos ou gorduras, a baixa proteína aumenta a produção de FGF21 .

Modelos animais reforçam o efeito: roedores em dieta cetogênica com proteína restrita apresentam aumento de FGF21, enquanto a moderação proteica mitiga esse efeito (jci.org). Revisões apontam que o maior estímulo à produção de FGF21 ocorre em dietas combinando baixa proteína com alta proporção de carboidratos (pmc.ncbi.nlm.nih.gov).

2. Mecanismos moleculares de ativação

A restrição de proteína ativa vias de detecção de estresse nutricional, notadamente a via GCN2 → eIF2α → ATF4, estimulando a expressão hepática de FGF21 (jci.org). Estudos em humanos confirmam o aumento da fosforilação de eIF2α no fígado após restrição proteica, vinculando diretamente esse mecanismo à indução do FGF21 (jci.org).

3. Adaptações metabólicas associadas

3.1 Aumento do gasto energético

A elevação de FGF21 correlaciona-se com aumento do gasto energético pós-prandial: nos participantes humanos, foi observado aumento de ~20 % no consumo de energia para manutenção do peso . Em roedores, dietas hipoproteicas induzem termogênese adaptativa, inclusive via ativação de genes relacionados à mitocôndria e à UCP1, além de aumento da oxidação de lipídios, efeitos mediadores do FGF21 .

3.2 Melhora inicial na sensibilidade à insulina

Nos momentos iniciais das dietas LPHC, observam-se melhoras na sensibilidade insulínica; porém, em relatos longitudinais, essa melhora se mostra intermitente, reduzindo-se rapidamente após o retorno a dietas normoproteicas (pmc.ncbi.nlm.nih.gov).

3.3 Preferências alimentares favorecendo proteína

O FGF21 age no sistema nervoso central para aumentar o apetite por proteína e reduzir a preferência por carboidratos simples e gorduras (pmc.ncbi.nlm.nih.gov). Esse mecanismo sugere retroalimentação que limita excessos de carboidratos.

4. Potenciais riscos e impactos negativos à saúde

4.1 Esteatose hepática

Modelos em roedores associaram dietas LPHC, especialmente com alta frutose, à esteatose hepática, simultaneamente ao aumento de FGF21, sugerindo que este hormônio também pode atuar como marcador de estresse metabólico .

4.2 Resistência ao FGF21

Em estados crônicos de obesidade ou dietas hipoproteicas prolongadas, pode surgir resistência ao FGF21, manifestada por níveis elevados do hormônio com resposta biológica diminuta, similar ao fenômeno observado na resistência à insulina .

4.3 Perda de massa muscular

Apesar de a energia ser mantida, a restrição de proteína pode comprometer a manutenção da massa magra, principalmente em populações vulneráveis como idosos, devido à deficiência de aminoácidos essenciais para síntese proteica.

4.4 Aumento de ingestão energética compensatória

A necessidade de elevar o consumo calórico para manter o peso, observada em humanos e animais, pode induzir aumento de gordura corporal ou alterar a composição corporal caso não acompanhada de estímulo anabólico (como exercícios de resistência) .

4.5 Impactos na regulação glicêmica e no equilíbrio nutricional

Dietas hipercalóricas ricas em carboidratos podem elevar picos glicêmicos, carga glicêmica e risco de disfunções metabólicas, alterando o perfil endocrinometabólico mesmo na presença de níveis elevados de FGF21.

5. Considerações epigenéticas e moduladoras

Intervenções dietéticas com restrição de proteína demonstraram causar alterações epigenéticas em modelo animal, como metilação de receptores nucleares envolvidos na homeostase glicolipídica, com possíveis efeitos transgeracionais. Além disso, a composição da microbiota intestinal pode influenciar os níveis circulantes de aminoácidos (exclusivamente valina), modulando a indução de FGF21 sob contextos dietéticos definidos.

6. Balanceando indicações e riscos

Embora a indução de FGF21 associe-se a adaptações energéticas e melhora inicial do metabolismo, isso não permite considerar a elevação isolada do hormônio como benefício universal. É essencial considerar:

  • Qualidade e tipo de carboidrato: açúcares refinados elevam risco de resistência insulínica e esteatose hepática.
  • População-alvo: indivíduos com obesidade, idosos ou diabéticos podem ser mais vulneráveis a efeitos adversos.
  • Adstringência na restrição proteica: deve manter aminoácidos essenciais para evitar catabolismo muscular e desbalanços nutricionais.
  • Monitoramento: avaliação constante do metabolismo hepático, glicêmico, composição corporal e níveis de FGF21 para detectar sinais de resistência ou efeito rebote.

Conclusão

Dietas eucalóricas com restrição proteica e elevado teor de carboidratos promovem aumento expressivo de FGF21, ganho de gasto energético e modulação da preferência alimentar. Contudo, os benefícios metabólicos podem ser transitórios e acompanham riscos potenciais como esteatose hepática, resistência ao FGF21, perda de massa magra e desequilíbrios metabólicos, especialmente em contextos de alta carga glicêmica. A indução de FGF21 não deve ser o único objetivo terapêutico, e sim um marcador dentro de contexto nutricional equilibrado, com atenção a composição da dieta, estímulo proteico-anabólico e monitoramento contínuo.

Referências

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