Manteiga, margarina e óleos: o que realmente dizem os dados sobre saúde cardiovascular e diabetes?


Um estudo de longo prazo acompanhou mais de 2.400 pessoas por aproximadamente 18 anos para investigar como diferentes tipos de gorduras consumidas no dia a dia afetam a saúde cardiovascular e o desenvolvimento do diabetes tipo 2. Os resultados desafiam algumas recomendações dietéticas tradicionais e oferecem novas perspectivas sobre o consumo de gorduras.

Metodologia do estudo

O estudo publicado no European Journal of Clinical Nutrition analisou dados do coorte Framingham Offspring, uma das pesquisas epidemiológicas mais respeitadas dos Estados Unidos. Os pesquisadores avaliaram 2.459 participantes com 30 anos ou mais, utilizando registros alimentares detalhados de três dias para determinar o consumo de manteiga, margarina e óleos não hidrogenados.

Os participantes foram acompanhados durante cerca de 18 anos para identificar novos casos de doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2. Além disso, os pesquisadores analisaram diversos fatores de risco cardiometabólico, incluindo níveis de gordura corporal, resistência à insulina, glicose em jejum e perfil lipídico.

Resultados sobre a manteiga

Contrariando expectativas baseadas em diretrizes dietéticas tradicionais, o consumo de manteiga em quantidades moderadas apresentou benefícios significativos. Participantes que consumiram mais de uma colher de chá (5 gramas) de manteiga por dia apresentaram:

  • 31% menor risco de desenvolver diabetes tipo 2
  • Menor resistência à insulina
  • Níveis mais elevados de lipoproteína de alta densidade (HDL-C)
  • Níveis mais baixos de triglicerídeos
  • Melhor relação triglicerídeos/HDL

Importante destacar que não foram encontradas associações adversas entre o consumo de manteiga e os níveis de lipoproteína de baixa densidade (LDL-C), contrariando a preocupação comum sobre esta gordura saturada.

Impactos negativos da margarina

O estudo revelou associações preocupantes com o consumo de margarina. Participantes que consumiram mais de 7 gramas de margarina por dia apresentaram:

  • 29% maior risco de desenvolver doenças cardiovasculares
  • 41% maior risco de desenvolver diabetes tipo 2

Estes resultados podem estar relacionados ao fato de que, na época da coleta de dados, muitas margarinas continham gorduras trans industriais, conhecidas por seus efeitos prejudiciais à saúde cardiovascular.

Efeitos dos óleos não hidrogenados

Os óleos vegetais não hidrogenados apresentaram resultados mistos. Embora não tenham sido associados ao aumento do risco de doenças cardiovasculares ou diabetes tipo 2, o consumo elevado (mais de 7 gramas por dia) foi relacionado a:

  • Índice de massa corporal 0,6 kg/m² mais elevado
  • Níveis de LDL-C 8 mg/dL mais altos

Possíveis explicações biológicas

Os pesquisadores identificaram várias explicações para os benefícios observados da manteiga. Este alimento contém ácidos graxos saturados de cadeia média e ímpar, além de ácidos graxos de cadeia ramificada, que podem melhorar a microbiota intestinal, reduzir a inflamação e aumentar a sensibilidade à insulina.

A manteiga também é fonte de nutrientes benéficos, incluindo colina dietética e vitaminas lipossolúveis A e K, conhecidas por seus benefícios cardiometabólicos. Estudos anteriores do mesmo coorte Framingham mostraram que gorduras saturadas provenientes de laticínios estão associadas a partículas de HDL e LDL maiores, o que pode reduzir a oxidação e a formação de placas ateroscleróticas.

Limitações e considerações importantes

O estudo apresenta limitações que devem ser consideradas na interpretação dos resultados. A população estudada era predominantemente de origem europeia caucasiana, limitando a generalização dos resultados para outras populações. Além disso, como se trata de um estudo observacional, não é possível estabelecer relações causais definitivas.

Os dados dietéticos foram coletados em um período anterior, quando muitas margarinas continham altos níveis de gorduras trans, o que pode não refletir as formulações atuais disponíveis no mercado. O estudo também não conseguiu separar diferentes tipos de óleos consumidos, uma vez que muitos participantes utilizavam misturas ou múltiplos tipos de óleos.

Implicações para as recomendações dietéticas

Os resultados sugerem que as recomendações dietéticas podem precisar ser reavaliadas em relação às gorduras saturadas, especificamente aquelas provenientes de laticínios como a manteiga. O consumo moderado de manteiga, definido como mais de uma colher de chá por dia, parece estar associado a benefícios cardiometabólicos em vez de prejuízos.

Estes achados se alinham com evidências crescentes de que nem todas as gorduras saturadas têm os mesmos efeitos na saúde, e que a fonte alimentar pode ser mais importante do que o tipo de gordura isoladamente. A complexa matriz alimentar dos laticínios, com seus diversos nutrientes e compostos bioativos, pode explicar os benefícios observados.

Considerações para profissionais de saúde

Para profissionais de saúde, estes resultados enfatizam a importância de considerar alimentos integrais em vez de nutrientes isolados ao fazer recomendações dietéticas. A qualidade da evidência científica continua evoluindo, e estudos longitudinais como este fornecem informações valiosas sobre os efeitos de longo prazo dos diferentes tipos de gorduras dietéticas.

É fundamental que futuras pesquisas continuem investigando os mecanismos subjacentes aos benefícios observados da manteiga e explorem se estes resultados se aplicam a diferentes populações e contextos dietéticos. Enquanto isso, o consumo moderado de manteiga pode ser considerado parte de uma dieta equilibrada, especialmente quando comparado aos potenciais riscos associados ao consumo de margarinas ricas em gorduras trans.

Fonte: https://doi.org/10.1038/s41430-025-01601-5

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