Durante o envelhecimento, o corpo humano passa por diversas mudanças que aumentam o risco de doenças crônicas como diabetes, doenças cardiovasculares e Alzheimer. Entre os fatores de risco mais relevantes estão o excesso de peso, o sedentarismo e a disfunção metabólica. Diante disso, estratégias como o jejum intermitente têm sido cada vez mais estudadas por seu potencial terapêutico — especialmente por sua capacidade de induzir a cetose, um estado metabólico que favorece o uso de gordura como fonte de energia, com impactos positivos no controle glicêmico e na sensibilidade à insulina.
Mas uma pergunta permanece: será que o que se come antes de começar o jejum pode afetar a velocidade e a eficácia com que o corpo entra em cetose?
Um estudo publicado em 2025 por Gipson e colaboradores trouxe uma resposta clara para essa dúvida. A pesquisa avaliou 24 adultos com mais de 50 anos, sedentários e com sobrepeso, comparando os efeitos de iniciar um jejum de 24 horas com dois tipos diferentes de shakes: um rico em carboidratos e pobre em gordura (HC/LF), e outro com baixo teor de carboidrato e alto teor de gordura (LC/HF). Ambos os shakes tinham o mesmo valor calórico e eram consumidos antes do início do jejum.
O principal resultado? O grupo que consumiu o shake LC/HF atingiu o estado de cetose — definido por níveis de beta-hidroxibutirato (BHB) acima de 0,5 mmol/L — por volta das 12 horas de jejum. Já o grupo que ingeriu o shake HC/LF não alcançou cetose nem mesmo após as 24 horas de jejum.
Esse achado é importante porque mostra que o conteúdo de carboidratos da refeição anterior ao jejum influencia diretamente na velocidade com que o corpo muda seu metabolismo de glicose para gordura — um processo conhecido como troca metabólica. Essa mudança é essencial para colher os benefícios do jejum, como a redução da resistência à insulina, melhora da sensibilidade metabólica e controle mais estável da glicemia.
Além disso, os pesquisadores observaram que, uma hora após a ingestão do shake LC/HF, os participantes tinham níveis de insulina 41,9% mais baixos e níveis de glucagon 23,6% mais altos, em comparação ao grupo HC/LF. Esses dois hormônios desempenham papéis opostos: enquanto a insulina inibe a queima de gordura e a produção de cetonas, o glucagon promove esses processos. Logo, a combinação hormonal favorecida pela refeição rica em gordura facilitou a entrada em cetose.
Outro dado relevante foi o comportamento dos hormônios incretínicos — GLP-1 e GIP — que regulam tanto a secreção de insulina quanto a de glucagon. Contrariando as expectativas, ambos foram mais elevados no grupo que consumiu o shake com mais gordura, sugerindo que a gordura pode ter um papel mais importante do que os carboidratos na liberação dessas substâncias.
Em termos práticos, o estudo sugere que pessoas mais velhas, com excesso de peso e metabolismo comprometido, podem otimizar os benefícios do jejum planejando melhor sua última refeição. Ao priorizar uma alimentação com baixo teor de carboidratos e maior teor de gordura antes de iniciar o jejum, é possível alcançar a cetose mais rapidamente e, assim, prolongar seus efeitos metabólicos positivos.
Vale destacar que, apesar dos resultados promissores, o estudo teve limitações. Por exemplo, a alimentação durante o dia seguinte ao jejum não foi controlada, o que pode ter influenciado os marcadores hormonais medidos após 48 horas. Ainda assim, os achados são relevantes para estratégias de jejum terapêutico, especialmente para populações em maior risco de doenças metabólicas.
Concluindo, o estudo reforça a ideia de que não apenas o jejum em si, mas também a forma como ele é iniciado, pode determinar sua eficácia. Um simples ajuste na composição da refeição anterior ao jejum pode acelerar a entrada em cetose e ampliar os benefícios metabólicos, tornando o jejum uma ferramenta ainda mais poderosa para o envelhecimento saudável.