Impacto do Jejum Prolongado na Estrutura e Metabolismo Energético dos Músculos Esqueléticos


Ao longo da história, jejuar tem sido uma prática presente em diversas culturas, mas seu uso terapêutico ainda causa receios, especialmente quando o assunto é perda de massa muscular. A preocupação é válida: o músculo esquelético representa não apenas força e movimento, mas também uma reserva metabólica essencial. Será que períodos prolongados de jejum podem comprometer essa estrutura vital, sobretudo em pessoas mais velhas?

Um estudo recente publicado no Journal of Cachexia, Sarcopenia and Muscle buscou responder essa pergunta com base em evidências sólidas. Conduzido por uma equipe internacional liderada por Pierre Croisille, a pesquisa avaliou 32 voluntários (homens e mulheres, metade com mais de 50 anos) submetidos a 12 dias de jejum com ingestão restrita a 250 kcal diárias, combinados com até 3 horas diárias de atividade física leve.

Um olhar profundo sobre o músculo

A inovação do estudo está no uso de tecnologia de ponta: ressonância magnética (MRI) e espectroscopia por ressonância magnética (MRS), que permitiram avaliar a estrutura, composição e metabolismo dos músculos com precisão. Além disso, testes de esforço físico e medidas de força muscular completaram o quadro.

Perda de peso sem perda de força

Ao final do jejum, os participantes perderam em média 5,9 kg — algo esperado. Mas, quando se observou especificamente a perda de volume muscular na panturrilha (em média 271 mL, cerca de 5,4%), notou-se que essa redução corresponde quase exatamente ao esvaziamento das reservas de glicogênio e da água associada, que ocorre naturalmente durante o jejum.

Ou seja, a “perda muscular” observada é, na verdade, a perda de conteúdo energético e hídrico temporário — não de tecido muscular funcional. Isso se confirmou com os testes de força, que mostraram que a capacidade de contração muscular permaneceu intacta, mesmo após quase duas semanas de jejum.

Adaptação metabólica e otimização energética

Um dos achados mais fascinantes foi a redistribuição das reservas de gordura nos músculos. Durante o jejum, as gorduras foram mobilizadas do meio extracelular para dentro das células musculares, onde estão mais acessíveis para serem usadas como fonte de energia. Essa mudança estrutural, acompanhada pelo aumento da oxidação de gorduras durante o exercício (medido pela queda no quociente respiratório), indica uma adaptação altamente eficiente do organismo.

Além disso, a capacidade oxidativa mitocondrial — essencial para a produção de energia — foi mantida em todos os voluntários e até melhorada entre as mulheres, que demonstraram recuperação mais rápida da fosfocreatina, sugerindo um uso mais eficaz das gorduras como combustível.

Nenhuma evidência de dano

Importante destacar: não foram observados sinais de inflamação, degradação proteica ou alterações prejudiciais à estrutura muscular. Após a reintrodução alimentar, a recuperação do volume muscular foi evidente, confirmando que o jejum não causa danos permanentes ao tecido.

Conclusão: o músculo humano sabe jejuar

Os resultados são claros: o corpo humano, assim como o de outros animais, é metabolicamente preparado para suportar períodos de escassez alimentar. Em um contexto controlado e com suporte profissional, o jejum prolongado não prejudica a função muscular — pelo contrário, parece estimular mecanismos de adaptação energética altamente eficientes. Isso lança nova luz sobre a prática do jejum terapêutico e reforça seu potencial como ferramenta segura na promoção da saúde metabólica.

Fonte: https://doi.org/10.1002/jcsm.13773

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