Estudo indica que o consumo de poucas porções de frango por semana pode aumentar risco de morte em 27%


O consumo de carne de frango aumenta o risco de morte por câncer gastrointestinal? Uma análise crítica das limitações do estudo

A associação entre o consumo de carne de frango e o risco de mortalidade por câncer gastrointestinal, apresentada no artigo publicado na Nutrients em abril de 2025, traz à tona uma série de questionamentos importantes. O estudo aponta que o consumo superior a 300 g de frango por semana estaria associado a um risco aumentado de morte por câncer gastrointestinal, sobretudo entre os homens. No entanto, diversas falhas metodológicas comprometem a solidez dessas conclusões e impõem cautela na interpretação dos dados.

1. Falta de distinção entre tipos de carne de frango

A principal limitação do estudo é a ausência de discriminação entre carne de frango fresca e produtos ultraprocessados. O questionário alimentar utilizado não diferenciava frangos assados ou grelhados de empanados, embutidos ou produtos industrializados ricos em aditivos químicos. Essa falha compromete a interpretação dos resultados, pois o perfil de risco pode variar substancialmente entre diferentes formas de apresentação e preparo do alimento.

2. Modo de preparo não avaliado

Outro ponto crítico é a omissão dos métodos de cocção, fator já bem estabelecido na literatura como influente na formação de compostos carcinogênicos. Técnicas como grelhar, fritar ou assar em altas temperaturas podem gerar aminas heterocíclicas e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, substâncias ligadas ao aumento do risco de câncer gastrointestinal. Ignorar essa variável reduz significativamente a validade das associações encontradas.

3. Óleos vegetais como potenciais coadjuvantes do risco

Embora o foco do estudo tenha sido o frango em si, não se levou em consideração a utilização de óleos vegetais refinados no preparo dos alimentos — especialmente comum em frituras domésticas e comerciais. Óleos como os de soja, milho e girassol, quando submetidos ao calor, oxidam facilmente e formam compostos pró-inflamatórios e potencialmente tóxicos. Ainda que não possam ser apontados como os principais culpados, esses óleos são possíveis fatores contribuintes não controlados, que podem ter distorcido a relação entre frango e risco de mortalidade observada no estudo.

4. Ausência de dados sobre atividade física

O estudo tampouco controlou para níveis de atividade física, outro fator essencial na avaliação de risco de mortalidade. Pessoas com maior consumo de carne de frango podem ter hábitos de vida mais sedentários ou outras características de estilo de vida que aumentam o risco de doenças, tornando difícil isolar o papel da carne de frango per se.

5. Margens estatísticas frágeis e possível causalidade reversa

Vários resultados do estudo se mostraram estatisticamente limítrofes, com intervalos de confiança que tangenciam o valor neutro de 1. Isso sugere que os achados podem ter ocorrido por acaso. Além disso, existe a possibilidade de causalidade reversa: indivíduos com problemas de saúde preexistentes podem ter optado por consumir frango por ser culturalmente considerado uma escolha mais leve ou saudável, distorcendo as associações de risco.

6. Amostra localizada e não representativa

O estudo foi conduzido em duas cidades pequenas do sul da Itália, o que restringe a capacidade de generalizar os resultados para outras populações com hábitos alimentares e estilos de vida diferentes. Além disso, os autores assumem, sem dados específicos, que o frango consumido era majoritariamente oriundo de criações industriais — fator que, se confirmado, poderia implicar em maior presença de ácidos graxos inflamatórios na carne, devido à alimentação baseada em grãos ricos em ômega-6.

Conclusão

Apesar de trazer uma hipótese provocativa, o estudo apresenta falhas importantes de concepção e execução que impedem conclusões definitivas sobre os riscos do consumo de frango para a mortalidade por câncer gastrointestinal. A ausência de controle para o tipo de carne, modo de preparo, uso de óleos vegetais refinados, atividade física e outros aspectos dietéticos limita a interpretação dos resultados.

Em vez de interpretar os achados como condenação ao frango, é mais prudente entender que a qualidade geral da dieta, o processamento dos alimentos, os métodos de cocção e os óleos utilizados no preparo são todos fatores relevantes que devem ser considerados em conjunto. Estudos futuros, mais abrangentes e com maior controle de variáveis, são necessários para esclarecer os verdadeiros impactos do consumo de frango na saúde humana.

Fonte: https://doi.org/10.3390/nu17081370

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