Durante anos, a creatina tem sido apontada como um dos suplementos mais eficazes para ganho de força e massa muscular. Ainda assim, rumores persistentes colocam sua reputação em xeque, especialmente em relação a um possível efeito colateral temido: a queda de cabelo. A teoria gira em torno da possibilidade de que a creatina aumentaria os níveis de diidrotestosterona (DHT), hormônio associado à calvície de padrão masculino. Para investigar essa suspeita de forma rigorosa, um grupo internacional de pesquisadores conduziu um estudo clínico inédito e meticulosamente controlado.
O estudo, publicado no Journal of the International Society of Sports Nutrition, acompanhou por 12 semanas um total de 38 homens saudáveis, entre 18 e 40 anos, todos com experiência prévia em musculação. Esses participantes foram divididos aleatoriamente em dois grupos: um recebeu 5 gramas diários de creatina monoidratada, e o outro, a mesma dose de maltodextrina (placebo). Nenhum dos envolvidos sabia qual substância estava ingerindo, garantindo o duplo-cego necessário para evitar viéses.
O protocolo foi criterioso. Além de manterem suas rotinas alimentares e de treino, os participantes passaram por avaliações hormonais e capilares detalhadas no início e no final do período. Foram medidos os níveis de testosterona total, testosterona livre e DHT no sangue, enquanto a saúde capilar foi avaliada por meio de técnicas avançadas como o Tricograma e o sistema de imagem FotoFinder, que analisaram densidade capilar, espessura dos fios e a proporção de folículos em diferentes fases do ciclo de crescimento.
Os resultados foram claros: não houve diferença significativa entre os grupos em nenhum dos marcadores capilares ou hormonais. Tanto os níveis de DHT quanto as proporções DHT:testosterona e DHT:testosterona livre se mantiveram estáveis, sem alterações que pudessem ser atribuídas ao uso da creatina. Também não foram observadas mudanças na densidade dos fios, número de folículos, fase de crescimento ou espessura capilar.
Mesmo a leve elevação nos níveis de testosterona total e a pequena redução na testosterona livre, observadas em ambos os grupos, foram independentes da suplementação com creatina. Os autores especulam que esses efeitos possam estar relacionados a fatores sazonais, uma vez que o estudo ocorreu entre o final do verão e o início do outono no hemisfério norte — período em que outros estudos já observaram flutuações hormonais.
Este é o primeiro estudo a investigar diretamente os efeitos da creatina sobre a saúde dos folículos capilares. Até então, o único estudo que sugeria aumento de DHT após suplementação foi conduzido em jogadores de rúgbi, por apenas três semanas e com uma fase de “carga” de 25g por dia — abordagem que não reflete o uso padrão entre a maioria dos praticantes de musculação.
Além de refutar a associação entre creatina e queda de cabelo, o estudo também reforça a segurança da substância quanto à função renal, já que não foram observadas alterações nos níveis de creatinina ou taxa de filtração glomerular (eGFR), parâmetros comuns para avaliação da saúde dos rins.
Contudo, os autores alertam para algumas limitações: o estudo envolveu apenas homens, durou 12 semanas e não avaliou predisposição genética à calvície — fator importante, já que homens com histórico familiar de calvície têm risco duas vezes maior de apresentar o quadro.
Ainda assim, os achados são relevantes: não há evidência de que a creatina cause ou acelere a queda de cabelo. Para os que suplementam com creatina visando desempenho físico, mas temem efeitos colaterais capilares, este estudo traz uma dose robusta de tranquilidade, baseada em dados concretos e rigor científico.