Eficácia e segurança de longo prazo de dietas com baixo carboidrato na remissão do diabetes tipo 2: revisão sistemática


O artigo em análise apresenta uma revisão sistemática publicada em 27 de setembro de 2025, que investigou se dietas com restrição de carboidratos, incluindo versões cetogênicas, mantêm benefícios no longo prazo para pessoas com diabetes mellitus tipo 2 (DM2). O interesse por essas estratégias decorre de duas questões centrais: a dificuldade histórica de manter controle glicêmico sustentado apenas com fármacos e a possibilidade de remissão do DM2 por meio de intervenções dietéticas estruturadas (HbA1c < 6,5% por ≥3 meses sem hipoglicemiantes). A revisão seguiu PRISMA e reuniu ensaios clínicos randomizados e não randomizados com ≥12 meses de seguimento, focando em HbA1c, peso, IMC, pressão arterial, perfil lipídico, uso de medicamentos e segurança.

Como o estudo foi conduzido

A equipe pesquisou PubMed e Cochrane (2000–2024), aplicando filtros de acesso aberto, estudos em humanos adultos e acompanhamento mínimo de 12 meses. Após triagem (duplicatas, títulos/resumos e texto completo), 6 estudos preencheram os critérios de inclusão, com duração de 1 a 8 anos e intervenções variando de <130 g/dia (low carb) a ≤50 g/dia (cetorrestrita). Os desfechos primários foram remissão e mudanças em HbA1c, peso e IMC; secundários incluíram pressão arterial, lipídios e eventos adversos. A qualidade metodológica foi avaliada com a escala de Jadad.

Principais achados quantitativos

Glicemia (HbA1c). Houve reduções consistentes de HbA1c nos grupos de intervenção ao longo dos estudos. Em um programa de atenção primária com 8 anos de acompanhamento, observou-se queda de 63 para 46 mmol/mol; em outro ensaio com 18 meses, a redução foi de 63,9 para 56,3 mmol/mol, superando o controle com restrição calórica.
Referências relacionadas:

  • Unwin et al., 2023 (avaliação de 8 anos): BMJ Nutrition, Prevention & Health
  • Sato et al., 2017 (RCT 130 g/dia): PLOS ONE

Peso corporal e IMC. A perda de peso foi um componente central dos resultados, com reduções sustentadas em vários estudos (por exemplo, –11 kg em 8 anos em atenção primária; –8,8 kg no primeiro ano de um programa intensivo com manutenção parcial até o 5º ano). A associação entre ≥10 kg de perda e remissão foi destacada.
Referências relacionadas:

  • McKenzie et al., 2024 (extensão de 5 anos com cuidado remoto e cetose nutricional): Diabetes Research and Clinical Practice
  • Lean et al., 2024 (DiRECT – extensão de 5 anos): The Lancet Diabetes & Endocrinology

Remissão. Em programas intensivos com substituição total de dieta e manutenção, a remissão alcançou 62% no 1º ano; em seguimentos prolongados, houve declínio gradual, chegando a 13% no 5º ano, porém com parcela relevante ainda mantendo HbA1c abaixo de 48 mmol/mol por períodos significativos.
Referência relacionada:

  • Lean et al., 2024: The Lancet Diabetes & Endocrinology

Pressão arterial e lipídios. Em alguns estudos, a pressão sistólica diminuiu (por exemplo, 140 → 132 mmHg em atenção primária). Quanto aos lipídios, foram reportados triglicerídeos menores e HDL mais alto; colesterol total e LDL variaram conforme contexto (adesão, fase de perda de peso e uso de estatinas), exigindo interpretação individualizada.
Referências relacionadas:

  • Davis et al., 2009 (low carb vs. low fat, 12 meses): Diabetes Care
  • Unwin et al., 2023: BMJ NPH

Uso de medicamentos. Em programas com intervenção intensiva e suporte contínuo, observou-se redução substancial do uso de hipoglicemiantes (até 87% sem medicação no 1º ano; ~40% ainda sem medicação no 5º ano) e menor necessidade de anti-hipertensivos em parte dos participantes.

Segurança e tolerabilidade

Nos estudos incluídos, não foram identificados sinais de segurança preocupantes no acompanhamento de 1 a 8 anos quando a intervenção foi supervisionada. Em geral, houve melhora de enzimas hepáticas e marcadores inflamatórios em alguns protocolos; durante fases de perda ponderal rápida, elevações transitórias do colesterol total podem ocorrer, fenômeno descrito em literatura e que requer monitoramento clínico individualizado. Uma metanálise de 23 ECRs (BMJ, 2021) não encontrou aumento significativo de eventos adversos em 6–12 meses e mostrou melhora de triglicerídeos, com variação não significativa de LDL em 12 meses.
Referência relacionada:

  • Goldenberg et al., 2021: BMJ

Interpretação dos resultados

A revisão sustenta que restrição de carboidratos, sobretudo quando associada a perda de peso clinicamente relevante e suporte estruturado, está ligada a:

  1. redução de HbA1c;
  2. perda de peso com impacto metabólico;
  3. probabilidade de remissão inicial elevada, com parte mantendo benefícios por vários anos;
  4. menor dependência medicamentosa.

Os autores observam que a aderência ao plano e a manutenção da perda de peso são fatores decisivos para sustentar os ganhos metabólicos ao longo do tempo. Em programas com telemedicina e acompanhamento recorrente, os resultados tendem a ser mais robustos, sugerindo que a organização do cuidado é tão importante quanto a composição da dieta.

Limitações importantes

A base de evidências ainda carece de ECRs de longa duração com desfecho primário de remissão, há heterogeneidade de protocolos (carboidratos, energia, suporte), autorrelato de adesão em muitos estudos e dados limitados de eventos clínicos duros no longo prazo. Esses pontos limitam comparações diretas e impedem síntese meta-analítica formal neste conjunto específico.

O que este conjunto de evidências permite concluir

A revisão conclui que dietas low carb (incluindo versões cetogênicas), quando bem estruturadas e acompanhadas, são estratégias viáveis para melhorar o controle glicêmico e induzir remissão do DM2 em parte dos pacientes, com perfil de segurança favorável nos horizontes avaliados. A longa duração do DM2, a recuperação de peso e a aderência modulam fortemente os resultados. A adoção clínica deve ser individualizada, com monitorização de parâmetros metabólicos, pressão arterial e perfil lipídico, reconhecendo a complexidade do tratamento do DM2 e a necessidade de suporte continuado.

Fonte: https://doi.org/10.7759/cureus.93340

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