Associação entre a ingestão de ácidos graxos poli-insaturados e o perfil de oxilipinas em prematuros


O que são oxilipinas e por que elas importam

As oxilipinas são moléculas formadas a partir da oxidação dos ácidos graxos poli-insaturados (AGPIs). Elas funcionam como mensageiros bioquímicos que participam de processos inflamatórios e de defesa do organismo. Essas substâncias podem ter efeitos pró ou anti-inflamatórios, dependendo da gordura de origem — especialmente entre os ácidos graxos ômega-6 e ômega-3.

Nos recém-nascidos, e sobretudo nos prematuros, essas gorduras são obtidas por meio do leite materno ou das fórmulas infantis. Com base nisso, pesquisadores japoneses da Universidade de Juntendo analisaram como a composição dessas gorduras na dieta influencia os níveis de oxilipinas no sangue de bebês nascidos antes do tempo.

O estudo, publicado em 2025 no Journal of Parenteral and Enteral Nutrition , investigou 27 prematuros entre 30 e 34 semanas de gestação, acompanhando a ingestão de ácidos graxos e o perfil de oxilipinas durante o primeiro mês de vida.

O que o estudo encontrou

Os pesquisadores observaram diferenças marcantes entre os tipos de gordura consumida e os compostos resultantes no sangue:

  1. Ácidos graxos ômega-6 (óleo vegetal – ácido linoleico): A ingestão desse ácido aumentou nas duas primeiras semanas de vida. Embora as oxilipinas derivadas do linoleico (chamadas OXLAMs) tenham mostrado leve tendência a subir, essa associação não foi estatisticamente significativa após ajustes. Mesmo assim, a literatura científica sugere que níveis altos desses compostos estão ligados a processos inflamatórios crônicos, como doenças pulmonares e intestinais em prematuros.
  2. Ácido araquidônico (AA, também ômega-6): Com o aumento da ingestão desse ácido, os pesquisadores identificaram redução significativa de vários metabólitos inflamatórios, como 11-HETE, 12-HETE e 15-HETE. Essa relação inversa indica que maior consumo de AA não aumenta a inflamação, como se supunha, podendo até moderar a produção de compostos oxidativos.
  3. Ácidos graxos ômega-3 (EPA e DHA): As oxilipinas derivadas do DHA, conhecidas por efeitos anti-inflamatórios, diminuíram conforme aumentava o consumo. Isso mostra que nem sempre mais DHA resulta em mais mediadores benéficos. A absorção e conversão dessas gorduras parecem depender de outros fatores metabólicos — o que pode explicar por que suplementações orais nem sempre produzem os mesmos efeitos que a administração intravenosa.

O papel controverso dos óleos vegetais

Os óleos vegetais são a principal fonte alimentar de ácido linoleico (ômega-6), que representa grande parte dos AGPIs na dieta moderna. Apesar de ser considerado “essencial”, o excesso desse ácido tem sido associado à produção de oxilipinas pró-inflamatórias, as mesmas encontradas em doenças como aterosclerose, diabetes tipo 2 e disfunções pulmonares.

O estudo ressalta que, embora a ingestão de linoleico em prematuros estivesse dentro das recomendações, sua elevação nas últimas décadas é um fenômeno global, resultado da substituição de gorduras animais por óleos de soja, milho e girassol. Essa mudança já foi observada inclusive no leite materno, cujos níveis de linoleico aumentaram desde a década de 1940.

Em modelos animais, dietas ricas em linoleico provocam aumento de marcadores inflamatórios e alterações cerebrais, ainda que também possam ter papel no desenvolvimento neuronal inicial. O ponto crítico, segundo os autores, é o equilíbrio entre ômega-6 e ômega-3, já que a predominância de linoleico pode deslocar a produção de oxilipinas protetoras.

O que isso significa na prática

Os achados sugerem que os óleos vegetais não são inofensivos , especialmente em contextos clínicos delicados, como o de bebês prematuros.

O estudo indica que:

  • A ingestão de gorduras poli-insaturadas altera o equilíbrio dos mediadores inflamatórios.
  • O consumo elevado de ácido linoleico pode gerar metabólitos com potencial pró-inflamatório, mesmo em quantidades consideradas seguras.
  • Já o aumento de ômega-3 (como DHA e EPA) não garante proporcional aumento dos compostos anti-inflamatórios.
  • A via de administração (oral ou intravenosa) e o estado metabólico do bebê influenciam profundamente esses efeitos.

Portanto, os pesquisadores recomendam monitorar a composição dos óleos usados em fórmulas infantis e considerar ajustes que reduzam a predominância de ômega-6, favorecendo um perfil lipídico mais equilibrado.

Conclusão

A pesquisa japonesa traz um alerta sutil, mas importante: os óleos vegetais, apesar de comuns na nutrição infantil, podem influenciar a formação de mediadores inflamatórios no organismo em desenvolvimento. Embora o estudo não aponte riscos diretos, ele reforça a necessidade de repensar a proporção de gorduras poli-insaturadas em dietas neonatais — e, por extensão, nas dietas modernas em geral.

As descobertas reforçam um ponto já discutido em estudos adultos: o excesso de linoleico pode estar ligado ao aumento de inflamações crônicas de baixo grau. Em bebês prematuros, esse desequilíbrio pode impactar sistemas ainda imaturos, incluindo pulmões e cérebro, que dependem de lipídios adequados para o desenvolvimento.

Em suma, compreender como as gorduras da dieta afetam o perfil de oxilipinas pode ser a chave para estratégias nutricionais mais seguras e individualizadas — especialmente nas fases mais críticas da vida.

Fonte: https://doi.org/10.1002/jpen.70020

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