Durante décadas, a gordura foi tratada como vilã na mesa do consumidor. Campanhas de saúde pública, diretrizes governamentais e a indústria alimentícia impulsionaram uma mensagem clara: para proteger o coração e manter o peso, é preciso reduzir ao máximo o consumo de gordura — especialmente a saturada. No entanto, em Eat Fat, Get Thin, publicado no ano 2000, o pesquisador Barry Groves apresenta uma crítica contundente a esse paradigma, reunindo evidências históricas, antropológicas e clínicas para demonstrar que essa orientação nutricional pode ter sido não apenas equivocada, mas perigosa.
A inversão do bom senso: quando a gordura virou problema
Groves inicia o livro mostrando que, ao contrário da crença popular, o ser humano evoluiu em um ambiente alimentar rico em gordura animal. Povos ancestrais, incluindo caçadores-coletores e comunidades pastoris tradicionais, consumiam proporções elevadas de gordura saturada sem apresentar os quadros modernos de obesidade, diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares. Esses dados contrastam com o aumento explosivo dessas doenças a partir da segunda metade do século XX, justamente quando as diretrizes passaram a promover dietas pobres em gordura e ricas em carboidratos refinados.
O autor expõe como a “hipótese lipídica” — a ideia de que gordura saturada eleva o colesterol e, portanto, aumenta o risco de doenças cardíacas — foi construída sobre bases frágeis, destacando o papel controverso do estudo de Ancel Keys, que influenciou profundamente as recomendações nutricionais a partir dos anos 1950. Groves argumenta que essa hipótese foi abraçada com entusiasmo político e econômico, mas sem a devida validação científica robusta.
Carboidratos: os verdadeiros promotores da síndrome metabólica?
Outro ponto central do livro é a responsabilização dos carboidratos como os grandes impulsionadores das doenças modernas. Groves apresenta evidências de que a ingestão excessiva de alimentos ricos em amido e açúcares — como pão, massas, cereais e produtos industrializados — estimula a hiperinsulinemia, promovendo resistência à insulina, inflamação crônica e aumento da adiposidade visceral. Segundo ele, ao remover a gordura da dieta, não só se perdeu um elemento saciante e metabolicamente neutro, como também se aumentou o consumo de alimentos ultraprocessados que favorecem o ganho de peso e a disfunção metabólica.
A ilusão das calorias e o fracasso da restrição
Groves também desafia o modelo tradicional baseado em “calorias ingeridas versus calorias gastas”. Ele afirma que a composição da dieta — e não apenas o volume calórico — é determinante para o metabolismo. Dietas ricas em gordura e pobres em carboidratos, afirma o autor, induzem um estado metabólico mais eficiente, com menor produção de insulina e maior queima de gordura corporal.
Além disso, ele critica a abordagem das dietas com restrição calórica crônica, alegando que elas reduzem a taxa metabólica basal, provocam fome persistente e resultam, na maioria dos casos, em recuperação de peso no longo prazo. O consumo adequado de gordura, por outro lado, preservaria o metabolismo e a saciedade, facilitando a adesão a longo prazo.
O papel protetor da gordura saturada
Ao longo do livro, Groves apresenta diversos estudos que questionam a associação entre gordura saturada e risco cardiovascular. Ele destaca que a relação entre colesterol total e mortalidade por todas as causas é, no mínimo, inconsistente, e em muitos casos, o colesterol mais elevado parece se associar a maior longevidade, especialmente em populações idosas.
Em sua argumentação, Groves defende que a gordura saturada, presente em alimentos como manteiga, banha, ovos e carnes gordas, desempenha funções estruturais e hormonais essenciais. Além disso, ele alerta para os perigos da substituição dessas gorduras naturais por óleos vegetais refinados e margarinas industrializadas, fontes de ácidos graxos poli-insaturados altamente suscetíveis à oxidação.
Conclusão: uma revisão necessária das diretrizes
Ao final da obra, Barry Groves propõe uma reformulação completa das recomendações alimentares modernas. Em vez de evitar a gordura, ele sugere que a população deveria se reconectar com uma alimentação ancestral, baseada em alimentos não processados, com alta densidade nutricional e proporção equilibrada entre proteína e gordura — com mínimo consumo de carboidratos.
Embora publicado há mais de duas décadas, Eat Fat, Get Thin antecipa muitas das discussões contemporâneas sobre a falência do modelo de alimentação baseado em carboidratos e a reabilitação das gorduras naturais. Trata-se de uma leitura provocadora, bem documentada e essencial para qualquer pessoa interessada em compreender as raízes das epidemias modernas de obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares.
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