As dietas ricas em proteína têm ganhado cada vez mais espaço entre adultos que buscam melhorar a composição corporal, controlar o apetite e promover a perda de peso. Apesar disso, persistem há décadas alegações de que o consumo elevado de proteína poderia trazer riscos à saúde — desde problemas renais até aumento do risco de diabetes tipo 2 e perda óssea. No entanto, uma análise detalhada publicada no The American Journal of Clinical Nutrition questiona com base científica a veracidade dessas suposições.
Ausência de danos renais em indivíduos saudáveis
Um dos principais argumentos contra dietas hiperproteicas é o possível impacto negativo sobre os rins. Contudo, os autores destacam que não há evidência robusta que relacione o consumo elevado de proteína com danos renais em pessoas saudáveis. Embora haja aumento temporário na taxa de filtração glomerular — uma adaptação fisiológica esperada — estudos clínicos e metanálises demonstraram ausência de efeitos patológicos mesmo com ingestões acima de 2,5 g/kg de peso corporal por longos períodos. Uma revisão sistemática recente apontou, inclusive, associação inversa entre alta ingestão proteica e risco de doença renal crônica.
Benefícios ósseos, não prejuízos
O medo de que dietas ricas em proteína provoquem desmineralização óssea também foi investigado. Embora a ingestão de proteína aumente a excreção de cálcio urinário, isso não se traduz em maior risco de fraturas. Na realidade, evidências mostram que, especialmente em idosos, a ingestão adequada ou elevada de proteína (≥ 0,8 g/kg/dia) está associada a maior densidade mineral óssea, menor taxa de perda óssea e menor risco de fraturas — desde que a ingestão de cálcio também seja suficiente. Os autores concluem que, do ponto de vista ósseo, a ingestão elevada de proteína deve ser vista como benéfica, não prejudicial.
Proteína e diabetes tipo 2: contexto importa
Outro ponto frequentemente levantado é a possível relação entre dieta rica em proteína e resistência à insulina. Embora estudos observacionais mostrem correlações entre proteína animal e maior risco de diabetes tipo 2, esses achados carecem de causalidade comprovada. Ensaios clínicos randomizados revelam resultados inconsistentes — em muitos casos, dietas com mais proteína mostraram melhora na sensibilidade à insulina, especialmente quando substituem açúcares refinados e carboidratos de baixa qualidade. A composição total da dieta, incluindo fontes proteicas e macronutrientes deslocados, influencia diretamente os desfechos metabólicos.
Longevidade e mortalidade: associações frágeis
Associações entre alto consumo de proteína e mortalidade têm sido observadas em estudos populacionais. No entanto, os autores alertam para os limites metodológicos desses estudos — como erros de recordatório alimentar e fatores de confusão — que dificultam estabelecer qualquer relação de causa e efeito. Além disso, muitas das associações negativas com proteína animal podem estar refletindo outros hábitos alimentares ou de estilo de vida correlacionados, e não o consumo de proteína em si. Assim, os dados existentes não sustentam a ideia de que dietas hiperproteicas reduzam a longevidade.
Considerações finais
A revisão conclui que não há evidência convincente de que o consumo elevado de proteína, dentro de limites praticáveis por adultos saudáveis, cause danos à saúde. Pelo contrário, muitos dos supostos riscos são baseados em extrapolações de estudos com desenhos inadequados ou em interpretações distorcidas da literatura. A tabela-resumo do artigo mostra que:
- Dano renal: evidência suficiente para descartar o risco em pessoas saudáveis.
- Perda óssea: evidência suficiente para descartar o risco.
- Diabetes tipo 2: a relação permanece plausível, mas não demonstrada.
- Redução da longevidade: atualmente considerada implausível.
Os autores recomendam que, ao discutir proteínas na saúde pública, seja adotada uma postura mais crítica e cautelosa, evitando a perpetuação de mitos que não se sustentam sob escrutínio científico rigoroso.
Fonte: https://doi.org/10.1016/j.ajcnut.2025.05.002
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