Creatina e saúde feminina: do ciclo menstrual à menopausa


Ao longo das últimas décadas, o uso de creatina foi amplamente estudado no contexto esportivo, particularmente entre homens. No entanto, a ciência recente tem revelado que este composto pode desempenhar um papel fundamental na saúde das mulheres em todas as fases da vida — da menstruação à gravidez, passando pela perimenopausa até a pós-menopausa. A revisão publicada no Journal of the International Society of Sports Nutrition destaca como a creatina pode ser uma aliada estratégica para além do ganho muscular, com potenciais efeitos positivos sobre cognição, humor, saúde óssea e metabolismo energético.

Diferenças fisiológicas e implicações no metabolismo da creatina

As mulheres apresentam uma taxa de síntese endógena de creatina cerca de 20% menor que os homens e, em média, um consumo dietético 30 a 40% inferior, especialmente por consumirem menos alimentos de origem animal — principais fontes naturais de creatina. Essas diferenças são acentuadas pelas flutuações hormonais ao longo do ciclo menstrual, gravidez e transição para a menopausa, influenciando diretamente a síntese, o transporte e a utilização de creatina.

Fase reprodutiva: energia celular e desempenho

Durante a fase pré-menopausa, a creatina demonstrou melhorar o desempenho físico e reduzir a fadiga, sobretudo quando combinada com treinamento de resistência. Estudos recentes também sugerem que a suplementação pode aumentar a hidratação intracelular, especialmente durante a fase lútea, atenuando sintomas como inchaço. Além disso, há dados indicando que a ingestão subótima de creatina pode estar associada a maior risco de distúrbios reprodutivos, como oligomenorreia e infecções pélvicas.

Sono, humor e saúde mental

Mulheres em idade fértil enfrentam altos índices de distúrbios de sono e saúde mental, frequentemente exacerbados pelas oscilações hormonais. A creatina, ao otimizar o metabolismo energético cerebral, pode favorecer ciclos de sono mais longos e melhorar o humor, especialmente em contextos de privação de sono. Evidências indicam que a creatina pode potencializar a eficácia de antidepressivos, além de contribuir para maior resiliência emocional.

Gravidez: uma possível necessidade condicional

Durante a gestação, a creatina ganha atenção como nutriente potencialmente essencial. A placenta e o útero são capazes de sintetizar creatina, mas grande parte da demanda fetal depende da ingestão materna. Dados dos EUA mostram que 57,2% das gestantes consomem creatina abaixo da recomendação mínima, o que pode impactar negativamente o desenvolvimento fetal. Estudos em animais demonstram que a suplementação materna pode proteger o cérebro, os rins, músculos e o sistema respiratório do recém-nascido em situações de hipóxia perinatal. Além disso, concentrações elevadas de creatina no colostro logo após o parto sugerem uma demanda crítica nas primeiras semanas de vida — algo ausente em fórmulas infantis vegetais.

Perimenopausa: uma lacuna crítica de pesquisa

Apesar do potencial promissor, ainda não existem estudos clínicos específicos sobre a suplementação de creatina durante a perimenopausa — período marcado por quedas hormonais progressivas e sintomas como perda de massa muscular, fadiga, alterações de humor e declínio cognitivo. A creatina poderia atuar como coadjuvante no combate à sarcopenia, na preservação da densidade óssea e na melhora da disposição mental e física. A suplementação nessa fase representa uma importante área de oportunidade para estudos futuros.

Pós-menopausa: benefícios bem estabelecidos

Entre mulheres acima dos 57 anos, a creatina tem sido eficaz na preservação da massa magra, força e saúde óssea, especialmente quando associada a exercícios de resistência. Estudos de longa duração indicam que a suplementação pode melhorar propriedades geométricas ósseas e reduzir o risco de quedas, oferecendo uma ferramenta acessível para manter a funcionalidade e a qualidade de vida.

Considerações sobre a suplementação

Os protocolos de suplementação não diferem entre homens e mulheres. Um protocolo de carga (20 g/dia por 5–7 dias) seguido por doses de manutenção (3–5 g/dia) é eficaz para saturar reservas musculares. Para aumento da concentração cerebral, doses maiores (até 20 g/dia) por uma semana, seguidas de 5–10 g/dia, podem ser necessárias. A regularidade na ingestão é fundamental para manter os benefícios metabólicos e funcionais.

Conclusão

A creatina emerge como um suplemento multifuncional e seguro, com aplicações que vão além do contexto esportivo, especialmente para mulheres. Seus efeitos benéficos na saúde óssea, muscular, cerebral e reprodutiva justificam o aumento do interesse tanto entre profissionais de saúde quanto entre consumidoras. Contudo, há uma necessidade urgente de mais pesquisas — especialmente em gestantes e mulheres na perimenopausa — para definir protocolos ideais, segurança a longo prazo e impactos sobre a saúde integral feminina.

Fonte: https://doi.org/10.1080/15502783.2025.2502094

Postagem Anterior Próxima Postagem
Rating: 5 Postado por: