A Dieta dos Homens da Montanha (1963)


A vida dos homens das montanhas — aqueles caçadores e comerciantes de peles que exploraram o Oeste americano no início do século XIX — foi marcada pela completa dependência da natureza selvagem. William E. Holston, em seu artigo The Diet of the Mountain Men publicado no California Historical Society Quarterly em 1963, apresenta um retrato fascinante e detalhado desse modo de vida singular, em que a dieta desempenhava papel central e revelador.

O contexto histórico e cultural

Frederick Jackson Turner descreveu a fronteira americana como "o ponto de encontro entre a selvageria e a civilização", e nada simboliza melhor essa tensão do que o cotidiano alimentar dos homens das montanhas. Longe das cidades do leste dos EUA, esses homens — em sua maioria isolados, sem instrução formal e marginalizados — adaptaram-se aos costumes indígenas, não apenas no modo de viver e vestir, mas também no que diz respeito à alimentação.

Tal como as tribos nativas, os trappers viviam da caça e praticavam um regime alimentar predominantemente carnívoro, baseado quase exclusivamente no que a natureza oferecia. Quando a caça era abundante, desfrutavam de fartura; quando escassa, a escassez levava-os a extremos de sobrevivência.

Carnes preferidas e métodos de preparação

A principal fonte alimentar era a carne de bisão, considerada superior até à carne bovina pelos trappers. O abate e o desmembramento seguiam técnicas indígenas: o animal era aberto pelo dorso e desossado em cerca de vinte cortes distintos. Em tempos de abundância, apenas partes nobres eram retiradas, como a corcova, as “depouilles” (faixas espessas de gordura ao longo da coluna), a “fleece” (gordura sob a pele), a língua e os órgãos internos — incluindo testículos e útero, quando se tratava de uma fêmea prenhe.

Entre as iguarias mais apreciadas estavam a medula óssea, o fígado e até mesmo o sangue fresco. Durante momentos de fome extrema, esses homens ingeriam carne e gordura cruas, quase imediatamente após o abate, ou preparavam jerky (carne seca ao sol) e pemmican — uma mistura de carne seca pulverizada com gordura derretida e, ocasionalmente, bagas desidratadas.

Outro prato peculiar era o boudin, as tripas do bisão, assadas inteiras até inflarem com vapor e depois consumidas rapidamente, muitas vezes em competições informais para ver quem engolia mais depressa.

Alternativas à carne de bisão

Quando os bisões não podiam ser caçados — especialmente nas passagens elevadas das Montanhas Rochosas —, os trappers recorriam a outras fontes de proteína: carne de puma (“painter meat”), carne de cão, cavalos, mulas, veados, alces e ursos. Carne de lontra e cauda de castor eram igualmente valorizadas, embora a carne de castor pudesse provocar intoxicação caso o animal houvesse se alimentado de certas plantas tóxicas.

Em situações extremas de fome, qualquer coisa comestível tornava-se alimento: carne putrefata retirada de carcaças, peles fervidas por horas, raízes, caracóis, sapos, cobras, formigas secas e até mesmo bolos feitos com formigas trituradas. Houve relatos isolados de canibalismo entre trappers em desespero, documentados de forma objetiva e sem sensacionalismo pelo autor.

Modos de cozinhar e conservação

A culinária era rudimentar: a carne raramente era bem-cozida e frequentemente assada em espetos improvisados sobre fogueiras de madeira ou mesmo sobre “bois de vache” (esterco seco de bisão). Sopa de medula e sangue era comum. A gordura — especialmente a gordura de rim e barriga — era altamente valorizada, mas seu consumo excessivo podia causar náuseas.

Saúde e longevidade surpreendentes

Apesar da monotonia e das condições extremas, os homens das montanhas gozavam, segundo registros, de excelente saúde. Isso desafiava a visão predominante da época — e até do século XX — de que uma dieta exclusivamente carnívora era incompatível com a boa saúde. Vilhjalmur Stefansson, explorador e antropólogo do século XX, confirmaria mais tarde que uma alimentação composta de carne fresca, crua ou levemente cozida e acompanhada de gordura animal poderia sustentar perfeitamente a saúde humana. Os trappers atribuíam sua vitalidade justamente a esse regime alimentar, afirmando que "se um homem pudesse sempre viver assim, nunca morreria".

Declínio e legado

A era dos homens das montanhas durou pouco mais de duas décadas. Nos encontros anuais de rendezvous, esses homens vendiam suas peles e celebravam com bebidas, tabaco, açúcar e café — luxos que contrastavam com a rudeza da vida no ermo. Com a substituição do chapéu de feltro de castor pelo de seda e a diminuição drástica das populações de castores, a cultura dos trappers entrou rapidamente em declínio.

Ainda assim, a dieta desses homens serve como exemplo histórico de como populações humanas puderam viver de forma quase integralmente carnívora, sustentadas pelas caças e pela engenhosidade culinária adaptada ao ambiente.

Fonte: https://doi.org/10.2307/25155578

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