Estresse redutivo: o outro lado do desequilíbrio causado pela superalimentação


Por muito tempo, os cientistas explicaram várias doenças metabólicas, como diabetes e gordura no fígado, com base em algo chamado estresse oxidativo — o excesso de radicais livres que danificam as células. Mas um grupo de pesquisadores da Huazhong University of Science and Technology, na China, mostrou que o problema pode também acontecer no sentido oposto. O estudo, publicado no Journal of Advanced Research, apresenta um conceito menos conhecido, porém cada vez mais importante: o estresse redutivo.

O que é o estresse redutivo

No interior das células, existe um equilíbrio químico delicado entre moléculas que doam elétrons (as chamadas “redutoras”) e moléculas que os recebem (as “oxidantes”). Esse equilíbrio é o que mantém o metabolismo funcionando bem.

Quando o corpo recebe energia demais, como acontece com dietas ricas em açúcar e gordura, ele passa a produzir uma grande quantidade de substâncias redutoras — especialmente NADH, NADPH e glutationa (GSH). O problema é que, em excesso, essas substâncias “entopem” o sistema celular, impedindo o bom funcionamento das mitocôndrias e de outras estruturas. O resultado é uma espécie de engarrafamento metabólico, em que o corpo já não sabe o que fazer com tanta energia disponível.

O papel da supernutrição

Segundo os autores, o estresse redutivo é um efeito direto da superalimentação.

Comer mais do que o corpo precisa — principalmente alimentos ultraprocessados — eleva muito o NADH, um dos principais carregadores de energia das células. Quando há NADH demais, o sistema mitocondrial perde o controle, os elétrons começam a “vazar” e formam radicais livres em excesso, justamente o que se tentava evitar. Assim, a tentativa do corpo de compensar o excesso de energia gera mais danos do que proteção.

Quando o corpo fica “redutivo demais”

O estudo mostra que o retículo endoplasmático, uma parte da célula que ajuda a montar proteínas, também sofre. Ele precisa de um ambiente levemente oxidante para formar corretamente as pontes químicas entre as proteínas. Em um estado redutivo, esse processo falha, e o corpo começa a produzir proteínas defeituosas.

Esse erro pode levar a uma reação em cadeia: inflamação, acúmulo de gordura no fígado, resistência à insulina e até problemas no coração.

O paradoxo dos antioxidantes

Durante muito tempo, acreditou-se que quanto mais antioxidantes, melhor. O estudo mostra que isso não é verdade.

Altas doses de suplementos como vitamina C e vitamina E, usadas de forma contínua, podem impedir que o corpo se adapte ao exercício físico e até aumentar a resistência à insulina.

Em outras palavras: quando o corpo fica “bom demais” em combater os radicais livres, ele perde o sinal natural que estimula a produção de energia e a queima de gordura.

O resultado é o oposto do esperado — mais fadiga, menos sensibilidade à insulina e maior acúmulo de gordura.

Fígado, gordura e coração

Os pesquisadores também destacam que o fígado é um dos órgãos mais afetados.

Quando há excesso de NADH, ele ativa genes ligados à produção de gordura, contribuindo para a doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA).

 No tecido adiposo, o estresse redutivo também faz com que o corpo armazene mais gordura e perca a capacidade de queimar energia de forma eficiente.

No coração, o efeito é ainda mais preocupante: estudos com animais mostraram que, ao estimular demais os sistemas antioxidantes, o músculo cardíaco começa a crescer de forma anormal (hipertrofia) e perde força. Isso acontece porque a produção de energia se torna desorganizada e o excesso de antioxidantes impede o funcionamento normal das mitocôndrias.

O papel real dos radicais livres

Um dos pontos mais interessantes do artigo é que os radicais livres não são sempre vilões.

 Em pequenas quantidades, eles ajudam na comunicação entre as células, estimulam a produção de novas mitocôndrias e melhoram o metabolismo da glicose e da gordura.

Ou seja, tentar eliminar totalmente os radicais livres é tão perigoso quanto produzi-los em excesso.

 O segredo está no equilíbrio — nem oxidar demais, nem reduzir demais.

O que isso muda na prática

A principal lição é simples: o equilíbrio é o que mantém o corpo saudável.

  • Comer mais do que o necessário e viver de produtos ultraprocessados empurra o organismo para o lado “redutivo”.
  • Tomar suplementos antioxidantes sem necessidade pode atrapalhar o metabolismo em vez de ajudar.
  • A melhor maneira de manter o equilíbrio redox é através de alimentação natural, atividade física regular e sono adequado, que naturalmente ajustam a produção e o uso de energia.

Em resumo, superalimentar-se é uma forma de poluir o próprio metabolismo, e tentar “limpar” o excesso com pílulas antioxidantes pode piorar o problema. O estudo propõe que futuras terapias aprendam a modular com precisão o equilíbrio químico das células, em vez de apenas tentar “apagar” os radicais livres.

Fonte: https://doi.org/10.1016/j.jare.2025.01.012

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